10.8 - A TEMÁTICA DA ÁGUA
NEUZA MACHADO
“A água, por seus reflexos, duplica o mundo, duplica as coisas. Duplica também o sonhador, não simplesmente como uma vã imagem, mas envolvendo-o numa nova experiência onírica” (Bachelard).
A água, por seus reflexos (várias dimensões sobrepostas), duplica e verticaliza o tempo suspenso entre o antes e o depois, propiciando sonhar com uma terceira margem, materializando na ficção uma realidade absurda. O ir e vir do pai, dentro da canoa, ao longo dos anos, sem aportar em terra, só se torna possível, aceitando-se os reflexos da água dinamizada como um convite a uma viagem transcendental. O leitor interage também com as águas dessa realidade estranha, sentindo a anormalidade e admitndo-a como fato verdadeiro, graças à tintura das recordações do filho afirmando-a como real. Só o sonhador de águas profundas (Criador ou Leitor) pode materializar uma terceira margem fora dos limites normais da existência.
Partilhando dessa realidade diferente, Artista e Leitor partilham da solidão do Homem da Era Moderna, daquele que se encontra enclausurado nos limites ilimitados do não-palpável. A terceira margem justifica o desterro dos que assumem viver em um espaço distante das dimensões usuais, espaço daqueles que alcançam o plano da consciência singular.
MACHADO, Neuza. Do Pensamento Contínuo à Transcendência Formal. Rio de Janeiro: NMachado / ISBN: 85-904306-1-8
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