A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: A VALORIZAÇÃO DO CAFÉ NO GOVERNO DO PRESIDENTE ARTHUR BERNARDES
ANTÔNIO DE SOUSA COSTA
Na época do que vou contar, o
Presidente da República era o senhor Arthur Bernardes. Ele valorizou o café,
que antes valia oito mil réis, e passou para cinquenta mil réis, que foi a
grande novidade de todos. Aqueles que não tinham café derrubavam matas e
plantavam café. Outros capinavam os pastos para plantar café.
Era um movimento grande nas estradas: carros de bois
que vinham de Santa Margarida, de São João do Manhuaçu, de São Francisco do
Glória, e de outros lugares, com fileira de até quinze a vinte carros, todos
cantarolando estrada a fora, aquela cantilena morosa própria dos carros de
bois, até chegar em Carangola, aonde era vendido o café, para exportação em
trem de ferro. No decorrer da viagem, durante quatro dias, os carreiros e
candeeiros arranchavam-se em casebres de beira de estrada, ou até mesmo ao
relento.
O transporte de café era feito também em lombo de
burro, cada tropa com dez burros, fazendo fileira também de dez a quinze lotes
de burros. Os tropeiros vinham gritando, batendo no couro dos animais, jogando
tolete de pau naqueles burros da frente. Era um Deus nos acuda, porque a
estrada era ruim e apertada e os tropeiros eram muito grosseiros e achavam que
a estrada era só deles. E quando encontravam um carreiro, que não arredava o
carro, para dar passagem pra eles, era
aquela discussão.
E, às vezes, saíam até brigas de pancadaria, parecia
que o povo havia enlouquecido com aquela alta do café. Mesmo com o preço alto
do café, as outras mercadorias continuaram com os preços antigos, não houve
alteração nos preços, tudo continuou no mesmo.
Eu me recordo de um dia em que, nós meninos,
vínhamos da Escola para casa. Logo que saímos, fora do Arraial, começamos a
encontrar carros de bois que vinham de Carangola, aonde os sitiantes foram
vender o seu café. Eram muitos carros, enfileirados, todos vazios, com os
candeeiros tocando os carros, e os carreiros vinham atrás do último carro, com
as mãos cheias de notas, em dinheiro, contando o dinheiro, e andando a pé atrás
do carro.
Nós éramos doze meninos que vinham da Escola, naquela
brincadeira. De repente, um deu um grito: “– Olha lá uma nota!” A nota estava a
uns dez metros de distância. Todos nós corremos pra pegar a nota, mas tinha um das pernas compridas, e que chegou
primeiro, e apanhou a nota, e desabalou na carreira. O menino das pernas
compridas correu pra valer, e todos
nós corremos atrás dele, mas não apanhamos a nota, pois ele era muito veloz na
carreira.
E ele chegou em casa do pai dele, e entrou correndo,
e nós atrás querendo que o dinheiro fosse dividido. Mas, a mãe dele disse: “– O
direito é do meu filho. O dinheiro tava
perdido. Aquele que panhou primeiro é
o dono do achado”. Mas, mesmo assim, ele passou muitos dias sem andar junto conosco,
com medo de ser agredido.
Estava chegando o dia de compra de uniforme, para a
festa de examinação, e a professora
Dona Guiomar exigia todos uniformizados. O dinheiro achado deu para comprar o
uniforme daquele aluno, sem precisar do dinheiro do pai. Foi um tempo bom para
quem tinha lavoura de café.
Nos outros anos seguintes, o café baixou de preço, e
foi a triste derrota de muitos fazendeiros. Aqueles que confiaram no café
fizeram dívidas volumosas e não puderam pagá-las. E precisaram entregar as
Fazendas, e passaram a viver de empregados, todos tocando lavoura à meia com os
novos donos de suas fazendas. Alguns fazendeiros ainda salvaram suas fazendas,
com a moratória de dez anos para pagarem, decreto-lei, dado por Getúlio Vargas,
depois de mil novecentos e trinta.