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quinta-feira, 29 de abril de 2010

3.2 – GUIMARÃES ROSA: MUDANÇAS NO DISCURSO NARRATIVO


3.2 – GUIMARÃES ROSA: MUDANÇAS NO DISCURSO NARRATIVO

NEUZA MACHADO



Abandonando a vontade de poder em suas instâncias múltiplas (reprodução do poder social, afetivo, carismático), o ficcionista sertanejo remodela sua matéria ficcional valendo-se do ato de trabalhar. As imagens saem do plano da criação, revigoradas pela vontade de trabalho. Amparado por esta vontade e pela imaginação dinâmica, o espaço apreendido adquire novos contornos, transformando-se num universo fragmentado, subjetivo, singular.

Neste plano intermediário discursivo, no qual se observam características poéticas, o narrador de Rosa (A Hora e Vez de Augusto Matraga) se afasta da diegésis, para enredar-se em seus próprios devaneios e circunlóquios. Revigorado pela vontade de trabalho, afasta-se da matéria enfocada, observando o sertão guiando-se pelo ponto de vista mágico do Criador Ficcional. Nhô Augusto, a partir desta decisão, é apenas um pretexto para a recuperação das recordações (matéria lírica interagindo com a matéria ficcional) e para a realização de um novo universo sertanejo modificado pelo crivo de sentimentos interiorizados.

Este novo universo, produto da imaginação dinâmica, foi criado a partir do sertão das recordações infantis. Para que isto acontecesse, valeu-se de uma matéria diferente, contrária às que habitualmente faziam parte de sua criação. Neste estágio intermediário (e isto se observa unicamente na narrativa A Hora e Vez de Augusto Matraga), lida estranhamente com o elemento fogo, procurando atingir o plano da profunda interiorização.

“Pelo fogo, o mundo resistente é de algum modo vencido pelo interior” (Bachelard)

Até então (nas páginas iniciais), o narrador estava submetido a uma causa sentimental ― ligada à imaginação formal ― que procurava resgatar um sertão pitoresco e primaveril, impulsionada pela novidade da descoberta de um talento especial. Orientado pelas lembranças, procurou ser objetivo, extasiando-se em descrever as minúcias exteriores do sertão.

MACHADO, Neuza. Do Pensamento Contínuo à Transcendência Formal. Rio de Janeiro: NMachado / ISBN: 85-904306-1-8

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