XI - MEMÓRIAS DE CIRCE IRINÉIA: A VINGANÇA DOS OPRIMIDOS ESCRAVOS
NEUZA MACHADO
O BisAvô Português de Antoinzinho Papai, com muita certa convicção! um Novo-Cristão!, amava exageradamente a BisAvó Cor de Mel. No entanto, apesar do grande amor pela esposa mestiça, o BisAvô de meu Pai era dono de muitos escravos, e era também um amo muito rude. Os escravos o abominavam, e não entendiam o fato desse amo ser tão mau, uma vez que sua esposa e filhos eram mestiços. E assim, repletos de profundo e duradoiro rancor pelo Senhor que os oprimia, armaram contra ele uma vingança terrível.
Em uma certa manhã, duas escravas, consideradas feiticeiras, foram ao mato colher ervas, depois foram para o galinheiro e recolheram penas de galinha, e, enquanto isso, uma dizia para outra: “― Nosso Sinhô, daqui a pouco, vai para a Cidade de Divino do Carangola com as pernas dele, mas não vai voltar sobre elas”. Dito e feito: o Sinhô, meu TrisAvô João Pereira da Cunha, saiu para a Cidade de Divino do Carangola com as pernas dele, vivo, e, ao voltar para casa, caiu do cavalo, já no estertor da morte, na soleira da porta de sua Fazenda. O João Barba de Argolão havia sido envenenado pelas escravas, deixando a Fazenda nas mãos da esposa, Sinhá Antoninha Mulata, e do Filho mais velho, também mulato. Isto aconteceu em meados do século XIX.
Penso, hoje, neste Final de Século XX, que as escravas “feiticeiras”, conforme ficaram conhecidas posteriormente, apenas envenenaram a matolotagem do BisAvô Português de meu Pai Antoinzinho Aquileu. Com certeza, ele parou, no trajeto do retorno para a Fazenda, para almoçar a mistura de carne seca com farinha de mandioca, preparada pelas escravas, e, não percebeu a armadilha. Certamente (estou a imaginar!), ele cavalgou (os últimos quilômetros da volta), coitado!, passando mal. Nem teve tempo de pedir perdão a Deus pelos grandiosos pecados (seculares) que foram cometidos por ele ao longo de sua vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário