A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: JOÃO ARGOLÃO E A GUERRA DO
BRASIL-IMPÉRIO CONTRA O PARAGUAI
ANTÔNIO DE
SOUSA COSTA
Passamos, agora, para um
outro caso sobre João Pereira da Cunha, o João Argolão, meu bisavô. Diziam que,
poucos anos depois que João Argolão veio da região de Ponte Nova para Cachoeira
dos Pereiras (uma extensão de terra localizada em Divino do Carangola), houve
uma guerra, que foi denominada como Guerra do Paraguai. Nessa época, os filhos
de João Argolão já estavam rapazes.
Como o Império do Brasil, naquele tempo, não tinha
um exército militar para lutar contra os inimigos, era preciso que todos os
brasileiros se reunissem em defesa da Pátria. A guerra durou sete anos e, já
quase no final, era preciso caçar gente, até com cachorro, para o combate. Como
naquele tempo o Brasil era ainda uma imensa floresta, o povo se escondia no
mato.
João Argolão, temendo que os seus filhos fossem
presos para combater na guerra, mandou fazer um rancho em uma encosta, bem
longe da Fazenda, no meio da mata. E mandou os filhos praquele rancho. E recomendou que não se fizesse anarquia [barulho],
para não alertar alguém que, por acaso, tivesse cachorro, procurando gente para
o combate. E os filhos, que eram obedientes, ficaram presos ali, quietos,
naquele deserto, quase sem ver a luz do sol.
Todos os dias, um escravo de João Argolão ia levar
comida praqueles rapazes escondidos.
Naquele deserto, só não era preciso levar água, porque o rancho fora feito na
cabeceira d’água, aonde eles apanhavam água para beber.
A guerra ainda estava acontecendo, quando, um dia,
eles (os filhos de João Argolão) mandaram o escravo, que ia levar a comida pra eles, falar com o pai, se eles
podiam dormir uma noite em casa, e que, depois, eles voltavam pro rancho novamente. João Argolão tomou
opinião com Sinhá Antoninha, sua mulher, se deveria deixar eles dormirem uma noite
em casa. Sinhá Antoninha concordou, pois já estava com saudade dos filhos, pois
já fazia tempo que eles estavam escondidos nas matas, com medo de irem pra guerra. E assim o pedido foi aceito.
O mesmo escravo que trouxe o pedido para o Sinhô
João Argolão deixar os filhos dormirem uma noite em casa, foi o mesmo portador
que levou a notícia, que eles podiam vir. E assim eles vieram dormir em casa.
Sinhá Antoninha já estava esperando os filhos, até
numa meia festa, pois a saudade era muita. Já havia bastante tempo que eles
viviam presos naquele rancho, no meio do mato, quase como se fossem criminosos.
Por sorte deles, parecendo até que foi mandado por
Deus, e foi mesmo, pois Sinhá Antoninha era devota e rezava todos os dias,
pedindo a proteção de Deus para seus filhos, justamente naquela noite em que
foram dormir em casa, houve uma tempestade, com chuva e vento muito fortes, e a
ventania arrancou uma árvore, das maiores, e a copa daquela árvore cobriu o
rancho, que ficou arriado no chão. Eles, João Argolão e Sinhá Antoninha,
compreenderam que foi a providência de Deus que salvou os filhos de não
morrerem esmagados debaixo de uma gaiada
de pau. E, daquele dia em diante, não mandaram os filhos se esconder para não
irem à guerra. Compreenderam que, para morrer, não precisa ir à guerra. A morte
está em qualquer lugar.
Mais tarde, depois que as
matas foram derrubadas, e também passou a estrada comercial, naquele lugar,
onde os filhos de João Argolão ficaram escondidos, o Tio Bastião Pereira, filho
do Argolão, casou-se e fixou a sua residência. Ele fez uma
grande casa de madeira, daqueles casarões com o pé direito alto, casa de
guieiro coberta de telha canoada, barreada com barro amassado e rebocada com
areia, com duas salas grandes, com dois quartos de frente para a estrada; no
centro tinha outra sala grande e mais dois quartos; e, nos fundos da casa,
tinha uma grande cozinha, com despensa. A casa de Tio Bastião era toda
assoalhada com tábua de cedro; os esteios eram de braúna (madeira que dura mais
de cem anos fincada na terra). Com a morte do pai João Pereira, o Barba de
Argolão, Sebastião recebeu a sua parte da herança, que era exatamente a
extensão de terra onde ele já estava morando.
Meu tio Sebastião Pereira e a esposa
Maria Luisa tiveram oito filhos, sendo dois homens e seis mulheres. Nome dos
homens: João e Francisco. Nome das mulheres: Maria, Sebastiana, Virgínia,
Amélia, Regina e Luzia. Esses foram os herdeiros de tio Bastião Pereira e tia
Maria Luisa. Neste momento em que conto esta história (meados dos anos
oitenta), não sei se ainda existem alguns dos filhos vivos, mas sei que os
netos são, até o dia de hoje, os donos da Fazenda. Os netos e os bisnetos de
tio Bastião ainda moram lá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário