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domingo, 21 de março de 2010

BACHELARD: PASSAGEM DOS COGITOS - 5


BACHELARD: PASSAGEM DOS COGITOS - 5

NEUZA MACHADO



Enquanto o Artista se imobiliza tensamente, suspenso entre o antes e o depois (o depois das durações bem feitas, promovedoras de pensamentos inovadores), Nhô Augusto refaz momentaneamente, como já foi dito, seu curso de vida, preso ainda ao elan vital, às paixões coletivas. O personagem, induzido exclusivamente pelo escritor do século XX (atentar para a posição de submissão do narrador-personagem, já que este, de ora em diante, não comandará mais a proposta de narrativa tradicional), passa a ter tempo para meditar e esquecer sua antiga personalidade de homem poderoso e destrutivo, adquirindo chances de se tornar um novo homem, ainda vital, no caso, carismático.

O narrador apresenta um aparente momento de transição. Aparentemente, o personagem procura esquecer o que foi antes, transformando-se num novo ser, criando dentro de si uma nova forma de se expressar no mundo. Aparentemente e temporariamente, surge um novo Augusto, repleto de bons propósitos, ansiando pelo céu, mas, na verdade, por ora, nada mudou. O que aconteceu foi a repetição do continuísmo temporal, ou seja, a perda de um poder (poder social), gerando um novo poder (poder carismático), exercido em nome da divindade.

Assim, por esta ótica, o início da narrativa (até a queda) e a segunda sequência (carismática), na qual observa-se a repetição do continuísmo temporal, com o personagem adotando uma nova estratégia de vida, simbolizam as experiências de vida da comunidade do sertão, material precioso, que fundamenta a vida de um povo. As "experiências de vida", segundo Walter Benjamim, encontram-se registradas na memória, e é a memória do Artista (as lembranças do sertão) que insiste em ressuscitar o personagem, em permanecer fiel às tradições, enfim, em ater-se ao tempo pleno bergsoniano, confiante no elan vital das ideologias sacralizadas.

As experiências de vida são relatadas em sucessivas gerações. É inerente ao povo sertanejo o hábito de contar estórias, passar para os jovens os atos heróicos dos corajosos, promover normas de vida, ensinar, aconselhar, incentivar à geração futura o desenvolvimento de feitos valorosos. Dentro desta ótica, o povo sertanejo mantém ainda um vínculo permanente com os povos antigos e o Artista, herdeiro do "ontem eterno” (Weber), pôde se beneficiar literariamente desta sua ligação com o passado.

MACHADO, Neuza. Do Pensamento Contínuo à Transcendência Formal. Rio de Janeiro: NMachado / ISBN: 85-904306-1-8

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