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terça-feira, 22 de março de 2011

PADRE ANTÔNIO VIEIRA E O QUINTO IMPÉRIO JUDAICO-CRISTÃO

PADRE ANTÔNIO VIEIRA E O QUINTO IMPÉRIO JUDAICO-CRISTÃO

NEUZA MACHADO

Eis um momento ideal para reconsiderarmos as previsões de Padre Antônio Vieira sobre o Quinto Império Judaico-Cristão (hoje, acrescentaríamos todas as outras religiões).

Segundo as premonições de Padre Antônio Vieira, Portugal seria o glorioso reino que assentaria os alicerces desse dito Quinto Império. E Vieira, naquele momento de iluminação místico-religiosa, estava residindo no Brasil-Colônia e o Brasil-Colônia pertencia à restaurada Monarquia Portuguesa de Dom João IV (um nobre português sem vínculos familiares com as anteriores dinastias, mas que foi escolhido pelo povo português para fundar a terceira dinastia de reis portugueses).

Será que estarei divagando, já com as faculdades mentais em decomposição, se penso que estamos já próximos desse dito Maravilhoso Quinto Império Judaico-Cristão-e-Outros (tão ansiado por Padre Antônio Vieira no século XVII), Império da Saudável Liberdade Religiosa, Império da União Sócio-Religiosa Entre os Diversos Povos, Império do Amor ao Próximo e ao Distante, por intermédio de nossa prodigiosa Língua Brasileira/Portuguesa?

Gostaria muitíssimo de transmitir aos queridos Amigos Portugueses infinitos agradecimentos, por terem legado ao Brasil (graças à índole indômita de seus antepassados) este admirável idioma.

Ainda, em agradecimento, republico aqui a minha verificação sobre a questão do Quinto Império Judaico-Cristão pré-anunciada por Padre Antônio Vieira ao longo do século XVII.

O Unificador (o Ungido para tal importante demanda) seria indubitavelmente um nativo de Portugal (um autêntico oriundo da Flor do Lácio Cultíssima e Bela) ou um Popular Ex-Governante de um outro país de língua portuguesa, um herdeiro da Flor do Lácio Inculta e Bela?

(Lembrem-se, meus caríssimos leitores, do fato de que os aventureiros nautas portugueses, que no passado enfrentaram as intempéries marítimas para a conquista de novas terras, eram quase todos, com raras exceções, incultos. Exatamente como os soldados romanos desbravadores...).

No início dos anos noventa escrevi uma apreciação histórico-crítica sobre o assunto e ora a reapresento [A ESTÉTICA DO PARADOXO: SOBRE ALGUNS SERMÕES (HISTÓRICOS) DE PADRE ANTÔNIO VIEIRA]. Naquela oportunidade, meditei sobre o já mencionado tema motivada por uma disciplina de literatura portuguesa/brasileira, ministrada pelo Professor Leodegário A. de Azevedo Filho no Curso de Pós-Graduação em Letras-Ciência da Literatura/Doutorado da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Penso que, em virtude dos atuais acontecimentos que envolvem belicamente o Oriente Médio, a anterior e incomum premonição de Padre Antônio Vieira poderia, muito bem, ser reavaliada.

Se for do interesse de meu leitor, peço-lhe que leia a seguir a minha apreciação sobre a historicamente reconhecida premonição de Padre Antônio Vieira.


A ESTÉTICA DO PARADOXO

1 - SOBRE ALGUNS SERMÕES (HISTÓRICOS) DE PADRE ANTÔNIO VIEIRA

NEUZA MACHADO


Penso na questão teórica do Maneirismo e do Barroco como algo que requer muita meditação e que dará margem para muitas futuras discussões, uma vez que o assunto vem motivando, ao longo dos anos, desencontradas teses, hipóteses teórico-históricas ainda não concretamente definidas.

Consciente destas desencontradas opiniões, ou especulações sobre esta questão ainda polêmica, desejo, inicialmente, traçar as metas de meu pensamento teórico-crítico sobre a oratória de Padre Antônio Vieira. Assim, a questão que se desenvolve, até os dias de hoje, sobre essas duas correntes estéticas (o Maneirismo e o Barroco), não apresentará, nas primeiras páginas, um caráter inovador, apenas refletirá uma síntese do que busquei e registrei ao longo de minhas leituras sobre a História da Literatura Portuguesa (Cf.: SARAIVA & LÓPES, História da Literatura Portuguesa). Reservarei um ponto de vista um pouco mais pessoal (mas, com certeza, não aleatório) para a segunda parte desta proposição, realçando as crenças de Vieira sobre o Encoberto e sobre o Mito do Quinto Império Judaico-Cristão, porque, graças ao reconhecimento do texto, fundamentado na hermenêutica atual, acrescido de conhecimentos sociológicos, históricos e religiosos, terei como interagir com um assunto controverso, sob a proteção do raciocínio interpretativo.

A hermenêutica se adapta aos meus propósitos (para explicar, exclusivamente, a obra de Padre Antônio Vieira), por ter sua origem nos primórdios da história religiosa do homem ocidental. Até há pouco tempo, falou-se muito desta linha de pesquisa nos meios acadêmicos. Atualmente, há a imposição da interdisciplinaridade (a interligação de todas as tendências críticas), ressaltando-se mais a Estética da Recepção (diálogo com o texto). A chamada hermenêutica profana (interpretação de textos literários), mesmo não sendo, no momento, o estudo soberano nos cursos de pós-graduação em Ciência da Literatura, não há, nos cursos de graduação em Letras, um conhecimento correto sobre seus questionamentos de origem, sua ligação com os textos sagrados, as divergências que a marcaram no decorrer de sua história, e, sobretudo, não há um conhecimento sobre a sua posterior incursão nos domínios da Filosofia e da Literatura.

Assim, retomando a história da Hermenêutica de base religiosa, o que a preocupou desde o seu advento foi o problema da correta interpretação dos Textos Sagrados. É bom lembrar que, no que se refere às interpretações de Vieira, inseridas em seus famosos sermões, uma retomada teórica, a partir do ponto de vista da Hermenêutica, torna-se indispensável. Desejo realçar que os meus conhecimentos sobre o assunto se baseiam em dados oferecidos por Emerich Coreth, no livro Questões fundamentais de Hermenêutica. A proposta inicial de seus estudos [estudos de Emerich Coreth] foi reconhecer a história do problema teológico e a sua ligação com as questões atuais da Hermenêutica da Literatura, em outras palavras, a questão do próprio conhecimento ao se contemplar as obras literárias. Os estudos hermenêuticos, aqui realçados sob a orientação de Coreth, irão proporcionar-me uma abertura que propiciará a defesa de meu objetivo central, o qual opta pelo desenvolvimento de uma reflexão pessoal sobre alguns sermões de Vieira. Esta reflexão, para se livrar dos afamados achismos críticos, se colocará sob a proteção de meus próprios conhecimentos de Ciência da Literatura, Literatura propriamente dita, História e Religião.

A Hermenêutica, como é conhecida hoje, é uma ciência que questiona a correta interpretação dos textos literários. No início da história religiosa da Igreja Ocidental, a questão da interpretação estava restrita apenas aos escribas, intérpretes das mensagens contidas no Antigo Testamento. Emerich Coreth, ao se referir aos escribas, situa-os como os primeiros exegetas que procuraram questionar a importância de uma correta interpretação dos Textos Sagrados. Observe-se que esses textos anunciavam o nascimento do Salvador, e os mesmos eram interpretados por sacerdotes rudes, portanto, interpretações sujeitas a falhas e ambigüidades. Com a instituição do Novo Testamento, as ambigüidades se desfazem, pois quem as esclarece não é outro senão o próprio Filho de Deus, o Salvador esperado. Segundo Coreth, o Novo Testamento se coloca desde as primeiras páginas como o único intérprete autêntico das Mensagens Sagradas, e isto se deve ao aval do próprio Jesus Cristo, ao procurar elucidar, para as multidões que o acompanhavam, todas as ambigüidades anteriormente questionadas, algumas que foram incorretamente interpretadas, de acordo com o que nos passa o Novo Testamento.

Fundamentando-me nas informações de Coreth, foi-me possível compreender porque Vieira, ao desenvolver os temas de seus sermões, sempre procurou interpretar versículos e salmos do Antigo Testamento referindo-se pouco aos versículos do Novo Testamento. Os textos do Antigo Testamento proporcionavam ao sermonista uma maior capacidade para desenvolver questões paradoxais, sem que, com isto, o sermão se resvalasse para o campo das impossibilidades. Resguardado pela própria ambigüidade dos textos do Antigo Testamento, Vieira pode desenvolver seus argumentos religiosos e sociais, paradoxais, misturando análise etimológica com análise gramatical, desenvolvendo pensamentos analógicos e argumentativos, além de se utilizar, como veremos nos sermões por mim revisitados, de arraigadas superstições, que o acompanharam até a morte. O sermonista, para fundamentar a sua proposta de evangelização, buscava nos textos do Antigo Testamento, principalmente, a matéria que o ajudaria a compor um discurso que estava mais preocupado com os problemas sociais da Corte portuguesa e da Colônia, do que propriamente com os ensinamentos divinos. Desenvolvendo duas propostas de argumentação [uma religiosa e outra profana], misturando conceitos, transmitindo idéias que chegavam ao plano da imaginação fantasiosa, Vieira deu vida literária a sermões que, distantes da técnica ensaística da oratória, enquanto Gênero, assumiram com grandeza a expressão da Literatura-Arte.

Paralelamente aos postulados hermenêuticos, entretanto submetida a postulados sociológicos, procurarei ainda identificar o orador sacro Padre Antônio Vieira como um ser social, inserido numa determinada fase da história social de Portugal e do Mundo, identificado com os valores sócio-religiosos de seu momento, mas atuando também como intermediário entre o Histórico e o Divino. Pelo ponto de vista da Sociologia do Texto Literário, os sermões de Vieira impõem-me repensar a realidade histórica de Portugal até o final do século XVII. Repensando os problemas sociais de Portugal, daquela época, por meio dos textos de Vieira, foi-me possível refletir sobre as diretrizes religiosas que pautaram a vida do Homem do período barroco.

Por tais motivos, reunirei, aqui, vários pontos de vista teórico-críticos pela ótica da interdisciplinaridade: Hermenêutica, Sociologia, História e Religião. Entretanto, devo informar, também, o meu conhecimento de cada um deles, em separado. Todos esses direcionamentos críticos estarão aqui a serviço da decodificação de alguns sermões de Padre Antônio Vieira. Firmarei meus pensamentos, notadamente, no Sermão de exéquias do Rei D. João IV e em alguns outros sermões centralizados na família real. Esses sermões estariam evidentemente catalogados como Gênero Ensaístico – literatura técnica, ensaio, oratória – se não fosse o alto teor de ambigüidades detectado nos textos. Graças a essas ambigüidades, tais sermões jamais poderão ser classificados como paraliterários. Há neles, indiscutivelmente, a marca genial de um escritor da estética barroca – estética do paradoxo –, cujos textos já foram classificados como Literatura-Arte.


2 - A QUESTÃO TEÓRICA DO MANEIRISMO E DO BARROCO

No final do século XV, observou-se uma nova formação existencial para o homem europeu. Naquele momento, o homem procurava alargar seus horizontes, rompendo com os valores comunitários, já ultrapassados, da Idade Média. Era o início das grandes navegações que iriam marcar o século seguinte e mudar a História do Mundo. No decorrer do século XVI, os ideais comunitários, religiosos e hierárquicos do período medieval já começavam a ser questionados, e iniciou-se a caminhada solitária do homem em direção a um futuro incerto. Os antigos valores de uso – a troca de um objeto por outro, por exemplo – cederam lugar à mediação do dinheiro, à busca de novas invenções [que iriam permitir o progresso], ao desenvolvimento de conhecimentos técnicos, à patenteação de máquinas industriais [que afastariam, posteriormente, o homem do campo, levando-o em direção à cidade]. Era o momento do capitalismo mercantil, dos ricos empresários capitalistas de origem judaica; era aquele o momento dos valores de troca, valores degradados, valores mediatizados pelo dinheiro, que fariam dos componentes da classe menos favorecida socialmente míseros assalariados submetidos às imposições das leis de um novo mundo em aceleradas transformações.

Quanto à Literatura, o século XVI foi o momento da retomada da cultura greco-latina e o abandono das concepções religiosas que predominaram na Idade Média. A Literatura comprazia-se em destacar o lado humano da existência, buscando nos modelos antigos as diretrizes da criação literária. O século XVI foi o momento de Camões e de sua epopéia nacional, na qual, ao evocar as grandezas de Portugal, o Poeta instaurou a idéia de individualismo – povo privilegiado – que marcaria Portugal nos séculos seguintes.

O final do século XVII marcou o momento do Humanismo angustiado, gerando tensão entre duas forças que se opunham e, ao mesmo tempo, se atraiam, fazendo da estética literária, daquele período principalmente, uma estética que se submetia aos valores da vida material [herança renascentista] e, ao mesmo tempo, aos valores da religião, herdados das tradições monásticas da Idade Média [valores estes jamais rejeitados pelo povo português, mesmo antes, quando os valores culturais do mundo ocidental estavam ligados à antiga cultura pagã].

Nas décadas finais do século XVI, aconteceram os graves problemas que marcaram a História de Portugal: o desaparecimento de D. Sebastião (1578) e a submissão da Coroa Portuguesa aos reis espanhóis. Era o momento da Contra-Reforma tentando restaurar os estragos reformistas de Lutero, procurando um novo equilíbrio para o desequilíbrio religioso gerado pelo Cisma. Era o momento da desesperança e do desengano; do homem em face de uma confusão existencial: o amor aos prazeres mundanos e o medo do castigo de Deus. Era o momento do Maneirismo, estética que registraria a fugacidade da vida, a precariedade dos valores humanos, a idéia de inevitabilidade da morte, da tensão entre a entrega aos prazeres da vida (visão pagã) e a entrega aos prazeres da alma (visão religiosa). Era o momento da estética ligada a elementos tardo-góticos, antitética, refinada e aristocrática: estética da hesitação e da dúvida.

Mas, paralelamente à estética maneirista, surgiu um novo ideal estético: o Barroco. Não pretendo destacar um momento preciso para o início do Barroco, uma vez que, historicamente, as duas estéticas se confundem; apenas existe uma tendência em pensar que o Maneirismo tivesse surgido um pouco antes do Barroco. Ao contrário das aristocráticas dúvidas maneiristas, a estética barroca privilegiou a camada popular, comunicando-se facilmente, apesar da concentração de algumas características da estética maneirista [tais como a idéia de inevitabilidade da morte, entrega aos prazeres da vida material, em contraponto com a fugacidade da vida, e outras, e que, na verdade, não eram características exclusivamente estéticas, mas, características também de uma época conturbada, angustiada, submetida a uma dolorosa tensão entre os valores do mundo e os valores religiosos]. Assim, por este ângulo, o Barroco foi também uma estética de ruptura e tensão, ressaltando o aspecto fugaz da vida. A diferença marcante é que, ao contrário do Maneirismo, o Barroco impressionava [e ainda impressiona] todos os sentidos do ouvinte ou leitor, porque provocava um impacto auditivo, sedutor, impedindo-o que parasse para raciocinar, ou apontar as possíveis falhas, ou mesmo constatar os acertos.

O Barroco se desenvolveu em torno dos ideais místicos da Contra-Reforma, não obstante o maneirismo estar mais próximo dela historicamente. Segundo Miguel de Unamuno, o Barroco foi um movimento pendular entre o espírito e a carne, sendo que a literatura calcada nos ideais do espírito destacou-se mais, já que estava relacionada ao movimento jesuítico da expansão da fé. Enquanto o Maneirismo se posicionava como a estética que privilegiava a antítese, o Barroco colocou-se como a estética do paradoxo, do espetaculoso, do redundante. Foi principalmente a estética que propiciou o surgimento de uma das figuras mais notáveis, no âmbito da Literatura Portuguesa e Brasileira: Padre Antônio Vieira.

É sobre esse gênio da oratória barroca que falarei daqui para frente, acentuando que foi de uma peculiar importância penetrar nos meandros de extraordinária mente argumentadora e geométrica, acompanhar o movimento de perguntas e respostas, habilmente interligadas e desenvolvidas, obrigando-me a acompanhar a sua oratória com o sentimento de respeito e admiração [evidentemente além do meu ponto de vista teórico]. Vieira impôs-me [ficcionalmente, bem entendido] acreditar em suas crenças mais irracionais e, ao fim destas minhas reflexões, a vislumbrar meu próprio sentimento de perda, porque suas predições não se realizaram.


3 - A PALAVRA SAGRADA E SEU MISTÉRIO

No sermão das exéquias do Rei D. João IV, Vieira dá início ao seu discurso, utilizando-se de dois versículos, retirados do Salmo 89(88), considerados pelos exegetas um dos mais belos hinos ao Criador. O Salmo relembra a aliança entre Deus e o Rei Davi, aliança na qual Deus prometia permanente proteção aos descendentes do Rei.

Fiz uma aliança com meu eleito,
Eu jurei ao meu servo Davi:
Estabeleci a tua descendência para sempre,
De geração em geração construo um trono para ti. (Salmo 89(88): 4-5)

Nos versículos seguintes, o Poeta bíblico Etã, o ezraíta, desenvolve um hino de louvor ao Criador (vv. 6-19), introduzindo logo a seguir um oráculo messiânico (vv. 20-38), contrapondo-o à evocação dos sofrimentos e humilhações infringidos, pelo próprio Deus, aos descendentes do ungido. No final do Salmo, o Poeta Etã se dirige inquisidoramente ao Criador, intimando-O a cumprir o prometido ao Rei Davi, mas desenvolvendo um tom mais brando no final, concluindo com uma prece em louvor ao Deus de seu povo, aquele que prometera, mas não estava cumprindo a promessa.

Vieira re-elaborou a temática do Salmo, nesse Sermão de exéquias, construindo um raciocínio que reequilibrasse todas as anteriores afirmativas, malogradas, em que visualizava em D. João IV a encarnação do rei encoberto, tão esperado pelos portugueses desde o desaparecimento de D. Sebastião em terras africanas. Assim, Vieira se utilizou desse Salmo para reafirmar o que havia dito anteriormente, em outro sermão, quando da ascensão do Duque de Bragança ao trono de Portugal, no qual havia predito que D. João era o escolhido por Deus para restaurar o reino de Portugal. A reafirmação, ao longo do sermão, se fazia necessária porque, mesmo com o Rei já morto, Vieira ainda acreditava que Portugal seria o Quinto Império, visualizado por Bandarra. D. João, quando de sua ascensão ao trono, foi apontado, pelo mesmo Vieira, como o Rei Encoberto, previsto pelo sapateiro-profeta de Trancoso. Com a morte do Rei, e consciente de que Portugal ainda não havia se convertido no Quinto Império, Vieira procurou reafirmar a profecia, transferindo-a para D. Afonso VI. O orador, para revalidar suas anteriores afirmações, buscou no Salmo 89(88) os elementos necessários que reforçariam a sua argumentação. Vieira comparou D. João a Davi, aquele Rei bíblico que fora ungido com óleo santo, pelas mãos do profeta Samuel, a mando do Deus dos hebreus.

Encontrei meu servo Davi
E o ungi com meu óleo santo;
É a ele que minha mão estabeleceu,
E o meu braço ainda mais o fortificou. (Salmo 89(88), vv. 21-22)

Para que se entenda esta comparação, faz-se necessário recordar que D. João IV enfrentou inúmeros problemas no início de seu reinado. Existia, por exemplo, uma guerra com a Espanha, porque esta não se conformava evidentemente com a perda do reino português. Houve uma restauração, mas essa restauração não foi pacífica. Outro grande problema enfrentado pelo novo rei foi o econômico, já que o tesouro real encontrava-se abalado, por ter sido administrado, até então, pelos reis espanhóis, e também pelos gastos na guerra. Além desses dois graves problemas – a guerra com a Espanha e as dificuldades econômicas – havia a possibilidade de uma nova guerra com os holandeses, já que estes ambicionavam o domínio das terras do Brasil. Para culminar, existiam também as brigas internas, os desacordos políticos, e uma série de problemas menores ligados à administração do reino.

Vieira vivenciou todos esses importantes momentos da História de Portugal desde o reinado de Filipe IV de Espanha. Nasceu durante o domínio espanhol; ordenou-se sacerdote da Companhia de Jesus ainda no reinado de Felipe IV; lutou no púlpito contra as intenções dos holandeses; presenciou historicamente a recuperação do trono – a restauração –; sensibilizou-se com os problemas enfrentados pelo novo rei e viu-se historicamente como defensor da Coroa de Portugal. Para defendê-la, valeu-se de sua condição de orador sacro, não medindo esforços e palavras para realizar tão importante tarefa. Buscou na História de Portugal e nos Textos Sagrados a matéria que comporia a defesa; interpretou a Bíblia, transformando-a, para que se ajustasse às necessidades de sua argumentação defensiva. Inverteu magnificamente o comentário da palavra sagrada, fazendo do sermão – tema religioso – comentário dos assuntos ligados à movimentação social da Colônia e do Reino. Assim, estava escrito – e Vieira acreditava em predestinações – que ele seria aquele que daria crédito a todas as profecias sobre Portugal, desde os sonhos proféticos de Afonso Henriques até às predições do sapateiro Bandarra.

Supposto, pois, que o meu rei e senhor D. João se me não quer representar morto, senão vivo, préguem-lhe outros as exequias de defunto, que eu não quero nem posso. O que só farei hoje será uma narração panegyrica das reaes acções de sua vida. Toda está admiravelmente recopilada nas palavras que propuz, que são do Psalmo oitenta e oito. Vamol-as explicando, ou aplicando cada uma de per si, que todas tèm mysterio. [Vieira. Sermões. Porto: Livraria Chardron, 1909, vol. XV: 282]

Para Vieira, aceitar a morte do rei, seria destruir todas as profecias messiânicas, por ele revitalizadas. Portanto, era necessário, ao longo do sermão das exéquias de D. João IV, reafirmar tudo o que já predissera, anteriormente, quando da coroação daquele mesmo rei, naquele momento, morto. O seu discurso era de pesar – aquele que fora seu amigo pessoal estava morto –, mas Vieira acreditava na ressurreição em outros corpos vivos – metempsicose –, e o candidato para tal ressurreição era o infante D. Afonso, aquele que seria o novo rei de Portugal. Por essas razões, buscou nas promessas do Deus dos hebreus – Deus próximo, Deus quase tangível –, feitas ao Rei Davi, a matéria que reforçaria as suas crenças sobre o Rei Encoberto. Antes, ele já havia ressuscitado o Rei D. Sebastião, afirmando que D. João IV era o Encoberto tão esperado pelo povo português. Com essa afirmação, conquistara o Rei, a Rainha e toda a Corte, quando de sua viagem à Portugal. Agora, aquele que fora escolhido por Deus para transformar Portugal no Quinto Império Judaico/Cristão – ou o Império de Cristo – estava morto e, apesar do forte sentimento de perda, Vieira não desiste da profecia e a transfere para D. Afonso.

Ainda, segundo Vieira, D. João IV, assim como acontecera com o Rei Davi, era o procurado por Deus, para salvar Portugal das mãos dos estrangeiros. Inveni, achei, encontrei: Assim como Davi fora procurado por Samuel na casa de Jessé, o belemita, a mando de Deus, da mesma forma D. João foi procurado na Casa de Bragança, entre vários candidatos ao trono. O sermonista se apoiou nos versículos 21 e 22 do Salmo 89(88), porque eles agiriam como auxiliares da idéia central, que era, no caso, reafirmar a crença na reencarnação do Rei Encoberto. Revitalizando cada palavra dos versículos escolhidos, foi construindo seu raciocínio sobre a predição, formando duplos e simultâneos pensamentos, cismando, pensando e imaginando a forma certa para impor a sua verdade e, com isto, convencer seus ouvintes/leitores, os súditos da Coroa Portuguesa, da grandiosidade de Portugal ante o mundo que o cercava na época. Já que o reino se encontrava abalado por disputas internas e externas, havia a necessidade de um orador convincente, que inspirasse ânimo ao povo e confiança no futuro. D. João fora o escolhido, segundo Vieira, pelo próprio Deus, e, a partir dessa afirmativa, o sermonista foi reconstruindo a histórica trajetória da ascensão do Rei ao trono, tecendo complexos pensamentos, inspirados na Bíblia, sobre o motivo da escolha.

Evidentemente, ao desenvolver o sermão de exéquias, Vieira estava reelaborando tudo o que já dissera antes, com outras palavras e sob a inspiração de outros textos bíblicos. Para reafirmar a predestinação, daquele que estava morto, iniciou uma nova abertura de raciocínio, transferindo o privilégio de escolha ao tronco familiar do rei morto. Consciente de que, a partir dali, teria meios de revitalizar suas idéias premonitórias, colocou a responsabilidade de concretização do Quinto Império nas mãos do herdeiro. Conhecedor profundo dos Textos Sagrados, buscou em Macabeus, capítulo 5, versículo 62, o motivo da escolha de Deus recair em D. João, em detrimento dos outros candidatos: Ipsi autem non erant de semine virorum illorum, per quos salus facta est in Israel (Op. cit.: 238), ou seja, (Mas) eles não pertenciam à estirpe desses homens aos quais fora dado libertar Israel. D. João – e, naquele momento, também a sua descendência – havia sido escolhido por direito divino.

Ao longo do sermão, recordou a História de Portugal, as freqüentes ameaças de Castela, a defesa de D. João I, Mestre de Avis, a ligação familiar que uniu o então rei ao Conde D. Nuno Álvares, por intermédio do casamento de seus filhos, e, a partir daí, se apoiou na frase bíblica, para dignificar a estirpe do novo restaurador da Coroa. Cabia à geração de D. João IV – nova geração de restauradores –, realizar as profecias.

Et unxit eum Samuel in medio fratum ejus (op. cit.: 284): Samuel apanhou o vaso de azeite e ungiu-o (Davi) na presença dos irmãos. Davi e D. João IV, Israel e Portugal, Samuel e Vieira: para que vendo Samuel quão grandes eram os homens que Deus deixava, entendesse quão grande devia ser o que Deus escolhia. Desta forma, não apenas D. João era o escolhido; também ele – Vieira – fora escolhido por Deus para ser o revitalizador da crença na reencarnação do Rei Encoberto. Muito achou Deus nelle, quando buscando rei entre tantos príncipes, deixando a todos, só a elle elegeu, e só a elle achou: Inveni.

David. David se chama El-rei D. João nestas palavras que lhe aplicamos: mas com que propriedade? (op. cit.: 285). A partir do nome Davi, Vieira recomeçou a reconstrução de seus pensamentos, fazendo perguntas e oferecendo respostas, aproveitando-se da afirmativa que fizera no início do sermão: todas as palavras têm mistérios. Vieira analisou as palavras do trecho bíblico escolhido sob os ditames barrocos do mistério e descoberta das palavras. Usou, assim, o que Saraiva chama de “geometria decorativa”, para caracterizar o estilo barroco, ou seja, "estilo catedral", de acordo com os ensinamentos do Professor Dr. Leodegário A. de Azevedo Filho. Desenvolvendo um discurso centrado em perguntas e respostas, Vieira construiu pensamentos convergentes e, ao mesmo tempo, díspares, em que as semelhanças e oposições entre o texto bíblico e a História de Portugal em ação se uniram, sem, com isto, destruir a convicção discursiva do orador. Assim, D. João IV foi comparado a Davi. Existiam tantas semelhanças entre os dois, segundo Vieira. Ambos, afeiçoados à música; ambos, domadores de feras; ambos, tendo um filho Salomão; ambos, prudentes, vigilantes, piedosos, justos; humildes e, ao mesmo tempo, majestosos; mas, principalmente, eram semelhantes, por terem vencido o Gigante. D. João vencera a monarquia espanhola e, de acordo com Vieira, fora em tudo semelhante a Davi.

Depois de analisar as semelhanças, o sermonista recuperou a história da batalha travada entre Portugal e Espanha, mostrando as dificuldades de tal empresa, já que Portugal era militarmente inferior. Mesmo com tantas dificuldades, Davi/D. João IV derrubou o gigante espanhol. Inveni David.

Servum meum: Meu servo” (op. cit.: 287). Davi, antes de ser rei, era um fiel servo de Deus: destruiu ídolos, cultuou a grandeza do Deus de Israel, curvou-se ante a Majestade Divina. Assim, também, agiu D. João IV: propagou a fé, aumentou as missões da Índia, da China, da Guiné, do Congo, de Angola e, também, a do Maranhão, onde Vieira se encontrava à época das exéquias. D. João, segundo Vieira, era um obedientíssimo servo de Deus.

Oleo sancto meo unxi eum. Ungi-o a elle com o meu oleo santo: Oleo sancto. (op. cit.: 291)

Na concepção premonitória de Vieira, D. João fora ungido com óleo santo, exatamente como ocorrera com o Rei Davi. O rei bíblico suplicou a Deus, no Salmo 141(140): “Que o justo me bata, que o bom me corrija, que o óleo do ímpio não me perfume a cabeça, pois eu iria comprometer-me com suas maldades”; Vieira reafirmou estes versículos, ajustando-os a D. João. O rei português da nova geração de restauradores fora ungido com óleo santo, e isto era determinante para Vieira. Todos os outros reis, excetuando Davi, foram ungidos com óleo pecador.

Que o óleo do ímpio não me perfume a cabeça”. O sermonista fez a apologia das virtudes do rei morto, relembrou suas palavras de resignada aceitação ao receber uma coroa que evidentemente não fora ambicionada por D. João, justificando assim as semelhanças entre os dois reis. Mas, ao desvelar as inegáveis qualidades de D. João IV, Vieira, sutilmente, procurou diferenciá-lo do rei bíblico. Se o salmista do Salmo 141(140) [que não é outro senão o próprio Davi], tivera consciência de que o óleo do ímpio poderia seduzi-lo e implorou a Deus que o salvasse de tão terrível destino, Vieira, ao contrário, assegurou o caráter puro e intocável do rei português. O salmista Davi revelou a sua necessidade de proteção, reconheceu-se fraco e propenso a ser seduzido; o rei português, segundo Vieira, foi, ao longo da vida, um homem virtuoso, imune às seduções do mal. Aceitara ser rei, ainda segundo Vieira, porque o povo necessitava de um soberano; não que, particularmente, almejasse tal posição.

Buscando um novo reforço para suas afirmações, o sermonista retirou do Primeiro Livro de Samuel – na Vulgata do século XVII, consta como Primeiro Livro dos Reis –, capítulo 9, versículo 24, novas idéias que demonstrassem o caráter íntegro do Rei e sua grande capacidade de trabalho: “Comede, quia de industria servatum est tibi. Come, aqui está diante de ti o que se separou”.

Para o rei escolhido (o rei bíblico aludido por Vieira, nesta passagem, é Saul, primeiro rei de Israel, anterior a Davi, ungido também com óleo santo), Samuel ofereceu um banquete, em que foi servido, segundo Vieira, o ombro direito de uma rês. Esta parte do animal fora guardada especialmente para Saul, que seria coroado rei a pedido do povo de Israel. O povo de Israel queria um rei como os outros povos que o cercavam. O rei de Israel, até então, era o próprio Deus. O povo israelita já não aceitava a idéia de ter por rei apenas uma divindade. Mesmo magoado com seu povo – povo escolhido –, Deus elegeu um rei para Israel, por intermédio do profeta Samuel. Vieira explicou, aos leitores da época, porque fora reservado para Saul o ombro direito da rês. “Os reis ungidos com o óleo de Deus coroam os ombros, e não a cabeça; porque o ombro é o lugar do trabalho, e a cabeça é o lugar da dignidade” (op. cit.: 292). Esta passagem do Antigo Testamento foi ressaltada apenas para demonstrar a face de trabalhador do rei português. “Senhor, se sou necessário para meu povo, não recuso trabalho”. Esta frase, evidentemente bíblica, ou de inspiração bíblica, foi atribuída, por Vieira, a D. João. O rei aceitara a coroa porque o povo necessitava de um líder. Assim, aceitava a dignidade da coroa – a coroa sobre sua cabeça –, mas oferecia seu ombro ao trabalho, ao pesado ofício de reinar. Não recusava o trabalho, porque fora ungido com óleo santo.

Unxi eum: Ungi-o a elle” (op. cit.: 293). Neste trecho, Vieira aludiu, ironizando, aos reis dos outros reinos da Europa, à época de D. João VI. Deus ungiu com óleo santo somente ao rei português; aos outros reis ofereceu apenas a coroa, os verdadeiros ungidos foram os criados e os validos, porque esses sim possuíam o poder.

Há reis que nem reinam, nem sabem: elles são os reis, e os seus validos são os que reinam; porque os validos são os que põem e os que dispõem, e os que fazem o que querem; e assim como não reinam, também não sabem; porque nem sabem a quem se dão os prêmios, nem sabem a quem se dão os castigos, nem sabem porque culpas. (Op. cit.: 293)

Observando este trecho do sermão, não é demais lembrar que durante dezoito anos, até 1642, o reino de França foi governado pelo Cardeal Richelieu, primeiro ministro de Luís XIII. Na verdade, Vieira pôs em destaque o fato, comentando que em França “quem tinha o governo era o Cardeal Richelieu” (op. cit.: 293). Também em Espanha quem governava de fato era o valido de Filipe IV, o Conde Duque de Olivares. Depois destas certeiras críticas, o sermonista realçou a figura do falecido rei, afirmando que ele possuía a coroa e o poder de fato, reinando sobre todos, assinando os papéis com a própria mão, analisando severamente cada papel, antes de colocar-lhe a sua assinatura. De acordo com as palavras de Vieira, o rei trabalhara arduamente durante o seu reinado. Até mesmo a música era ouvida à hora da sesta e pela madrugada, para não perturbar o seu ritmo de trabalho.

Manus enim mea auxiliabitur ei, et brachium meum confortabit eum: A minha mão o ajudará, e o meu braço o esforçará. (Op. cit.: 294)

Aproveitando-se deste versículo bíblico, Vieira aludiu a um fato premonitório, quando da coroação de D. João IV. Quando o novo rei estava sendo aclamado, diante da Igreja de Santo Antônio, o braço da imagem de Cristo crucificado despregou-se e ficou estendido diante dos aclamadores. Todos viram nesse episódio uma clara demonstração do apoio de Deus para com a nova dinastia real que se iniciava. “Manus mea auxiliabitur ei”. Depois de recordar o episódio, Vieira passa a relatar os vários momentos em que Deus auxiliou as empresas do rei, como, por exemplo, a vitória sobre Castela. Novamente, busca nas palavras da Bíblia o reforço para o que tem a dizer. No Segundo Livro dos Reis, capítulo 6, versículo 18 – na Vulgata está assinalado como Quarto Livro dos Reis – o profeta Eliseu, sucessor de Elias, quando percebeu que os arameus ameaçavam investir contra Israel, orou a Deus, implorando proteção para os israelitas: “Digna-te ferir essa gente de belida”, ou seja, cegá-los momentaneamente. E Deus acatou a sugestão de Eliseu que, assim, pode levá-los aos israelitas. Depois, o profeta pede a Deus que os faça novamente enxergar e Deus atende o pedido de Eliseu. O perigo passara e os arameus estavam agora sob o poder do reino de Israel. O Rei pergunta ao Profeta se deve massacrar os arameus, recebendo resposta negativa, já que era costume entre os israelitas o massacre de prisioneiros de guerra. Ao invés de massacre, os prisioneiros recebem bom tratamento e são repatriados, depois de um grande banquete oferecido pelo rei. Algo parecido, segundo Vieira, fizera Deus aos castelhanos, impedindo assim que dominassem novamente o reino português. Deus socorrera Portugal e, para reforçar esse socorro, Vieira não hesitou em reproduzir mais um versículo bíblico, agora apoiado no Novo Testamento, em Mateus, capítulo 26, versículo 47, buscando na atitude de São Pedro, defendendo o Horto, o raciocínio certo para compor o seu discurso. Deus socorrera Portugal, como havia socorrido o povo israelita da invasão dos arameus, sem lutas. São Pedro defendeu o Horto, usando sua espada; com a espada, cortou a orelha de um soldado e foi energicamente repreendido pelo Mestre: “Guarda tua espada no seu lugar, pois todos os que pegam a espada pela espada perecerão” (Mateus, 26, 52). Deus socorrera Portugal, atrapalhando os “conselhos” do Conde de Onhate: “O Onhate allumiava bem: mas Deus, porque amava a David, infatuou o conselho de Achitofel” (op.cit., p. 294); o Conde era um bom conselheiro de guerra, mas Deus estava com D. João IV. Vieira compara o Conde de Onhate a Achitofel, e o rei de Portugal a David. Aquitofel, no Segundo Livro de Samuel – na Vulgata, Segundo Livro dos Reis – é o conselheiro de Absalão, filho de David, que pretendia destronar seu pai. “Mas Deus, porque amava a David, infatuou o conselho de Achitofel”, ou seja, não permitiu que se realizasse a vitória de Absalão.


Usando frases bíblicas – às vezes, destorcendo o sentido correto, como é o caso do versículo 47, capítulo 26, de Mateus, cum gladiis, et fustibus, aplicado à atitude do discípulo de Cristo que cortou a orelha do soldado, quando, na verdade, a frase se liga aos que vieram prender Jesus, sob a orientação de Judas –, Vieira foi compondo seu raciocínio, cujo objetivo era abrir caminho para as futuras transferências visionárias, já que o mito do Quinto Império era algo arraigado em seu espírito. Portanto, não era demais usar também um versículo de São Lucas, em que o evangelista, referindo-se ao nascimento de São João, diz: “E a mão do Senhor estava com ele” (Lucas, 1, 66). A mão do Senhor também estava com D. João, segundo Vieira, e usando a palavra mão, ligando-a à mão de Deus, foi encadeando os próprios pensamentos e impondo ao ouvinte e/ou leitor a sua verdade dos fatos que estavam ocorrendo. “E a mão do Senhor estava com ele”. Segundo Vieira, desde o início do reinado da reconquista, Deus foi um aliado do rei. Vieira, ao longo do sermão foi/vai apontando os momentos importantes que afiançaram a proteção.

Et brachium meum confortabit eum: E o meu braço ainda mais o fortificou” (op. cit.: 296). A palavra sagrada e seu mistério. A palavra sagrada não possuía mistério para Vieira, porque estava a serviço de sua engenhosidade e genialidade.

Deus não usou somente as mãos para orientar o rei de Portugal, usou também o braço, para o proteger nos momentos difíceis. Segundo Vieira, o rei não andava armado, não levava guardas quando viajava, enfim, não se protegia convenientemente. Esses cuidados, tão necessários, vinham de Deus, já que o braço de Deus o protegia. No entanto, o perigo o espreitava sob a forma do exército de Castela.

Todos estes excessos de valor destemido fazia aquelle grande coração, constatando-lhe das grandes diligencias que Castella fazia por lhe tirar a vida nas acções e nos logares mais sagrados. Ah, que se me perde aqui a minha similhança de David! Mas eu a dou por bem perdida. (op. cit.: 297)

Ah, que se me perde aqui a minha similhança de David”, ou seja, David não agiu como agiu D. João e, muitas vezes, procurou proteger-se dos inimigos. Vieira relata um episódio em que David fugiu do exército do rei Saul, subindo com seus homens para um lugar seguro. “Ascenderunt ad tutiora loca”: Subiram para o refúgio, Primeiro Livro de Samuel (na Vulgata do século XVII, Primeiro Livro dos Reis), capítulo 24, versículo 23. O sermonista, nesse trecho, procurou valorizar a coragem do rei português, diminuindo habilmente o valor de David.

O sermão das exéquias do rei D. João IV só foi encontrado depois da morte de Vieira e, segundo os apreciadores de sua obra, possui muitas falhas e lacunas, uma vez que o seu autor morreu antes de realizar a correção final. Mas, para mim, vale como documento de uma época, além de se detectar nele a face de um sacerdote de Cristo que acreditava em premonições, reencarnações, astrologia, e outras crendices censuradas pela Igreja Católica. Mas, de acordo com Antônio José Saraiva e Óscar Lopes – História da Literatura Portuguesa – a crença na reencarnação era algo muito difundido no século XVII e, assim, as crendices de Vieira não eram anormais.

O tratamento a que Vieira sujeita as Trovas do Bandarra para apontar em D. João IV o “rei Encoberto”; para demonstrar a sua futura ressurreição, uma vez que morreu sem se cumprir o Quinto Império; para transferir depois o Quinto Império para D. Afonso VI, para D. Pedro II, para seu gorado primogênito e finalmente para seu segundo, põem, é certo, o problema da sua sinceridade. Mas devemos talvez relacioná-lo com a crença cabalística na reencarnação, ou metempsicose, muito difundida entre os Judeus da época, e que já fora expressa pelo cristão-novo Manuel Bocarro Francês. Além disso, bem sabemos como o princípio lógico da não-contradição, o senso do absurdo pouco afeta as ideologias enraizadas. (Saraiva & Lopes [1979], op. cit.: 556)

Desenvolvo um estudo do texto das exéquias de D. João IV porque, a partir dele, pude constatar a habilidade de Vieira em transferir para os sucessores do rei a sua crença na reencarnação do Rei Encoberto, aquele que cumpriria a profecia sobre o Quinto Império. Assim, revisitando também outros sermões, pude observar os volteios mentais do grande sermonista para dar concretude às suas visões messiânicas. Por exemplo, no sermão oferecido secretamente à Dona Maria Francisca Isabel de Saboya, primeira esposa do rei D. Pedro II de Portugal, Vieira não escondeu seu desapontamento pelo falecimento do primogênito. Iniciou, assim, seu discurso, enviando queixas a Deus, que não estava cumprindo suas promessas, uma vez que o prometido herdeiro varão nascera, mas não sobrevivera. O pregador empenhara sua palavra, valendo-se das visionárias promessas de Deus, garantindo um filho varão para o rei D. Pedro II. Antes, suas outras afirmações não se realizaram: D. Afonso VI, predito por Vieira como a nova reencarnação do Rei Encoberto, não conseguiu terminar o seu reinado, submetendo-se ao poderio do irmão. Este, também assinalado por Vieira, por sua vez, não estava realizando o sonho do Quinto Império. Tornou-se urgente, portanto, transferir a ressurreição para o provável herdeiro varão do trono de Portugal. O herdeiro nasceu, mas, talvez, em virtude da anterior ligação, ilícita e pecaminosa, dos pais, logo depois, morreu.

Vieira recordou, ao longo do texto de pêsames, o discurso do nascimento:

Dividi aquele sermão em duas partes: uma em que desempenhei a palavra de Deus, e outra em que empenhei a minha: e a ambos estes empenhos cortou o cumprimento, e a esperança a morte. O empenho da palavra de Deus era, que na prole atenuada da décima-Sexta geração dos nossos reis havia ele de olhar e ver; isto é, lhe havia de dar um filho varão: mas como o deu e levou tão arrebatadamente, para nós o mesmo foi dá-lo, como se o não dera; e para ele o mesmo foi ser, como se não fora. (op. cit.: 37)

Para não ser condenado por seus ouvintes/leitores, como de hábito, Vieira buscou nos Textos Sagrados o material de sua defesa, e refez novamente a promessa, contando com a juventude da rainha, para uma outra e certa gravidez. “Bastava, torno a dizer, para que a soberana liberalidade do mesmo Senhor, depois de lhe tirar o primeiro, não haja de faltar em lhe dar o segundo” (op. cit.: 51). Para desgosto de Vieira, com o passar dos anos, depois do nascimento de uma filha, ficou patenteada a esterilidade da rainha.

Os sonhos de Vieira retomaram força com a morte da rainha, alguns anos depois. No sermão de exéquias, pregado em setembro de 1684, o sermonista não conseguiu disfarçar o seu contentamento. Habilmente, misturou protestos de tristeza com cânticos de confiança em relação ao futuro, já que a morte da rainha permitiria um novo casamento ao rei, ainda em condições físicas para se tornar pai. Ainda havia uma forte possibilidade de realização das antigas promessas messiânicas. E aconteceu realmente o novo casamento do rei D. Pedro com Maria Sophia Isabella, “a augustíssima de Áustria” (op. cit.: 166), proporcionando, posteriormente, o nascimento do príncipe D. João, aquele futuro rei de Portugal, que marcaria tão tristemente a História do Brasil com sua ambição desmedida.

No sermão de ação de graças pelo nascimento do novo herdeiro da coroa portuguesa, a primeira linha de raciocínio de Vieira se valeu, como de hábito, de trechos da Bíblia. O sermão sempre foi [e continua sendo], obrigatoriamente, um raciocínio que tem como tema central um pensamento bíblico, mas é evidente que a segunda premissa – a linha de raciocínio ligada aos acontecimentos sociais da família real e de Portugal – era mais importante, em virtude do orador preferir colocar em destaque a história de Portugal, que estava acontecendo, contrapondo-a com os fatos do passado e com as visões do futuro. Vieira sentiu o desenrolar dos acontecimentos históricos que envolviam Portugal no século XVII; sentiu em profundidade o seu próprio momento, ligado ao momento do reino, sabendo-o uma parte importante da História. D. João IV, o restaurador, havia retomado os poderes reais cedidos ao reino de Espanha desde a morte de D. Henrique e, isto, aconteceu no apogeu da fama do Padre Antônio Vieira como orador sacro. Assim, no sermão de ação de graças pelo nascimento do príncipe D. João, Vieira continuou não abandonando a idéia de que Portugal se destacaria como o Quinto Império e viu, nesse nascimento, a possibilidade de concretizar a sua crença, tantas vezes malograda, desde D. João IV, de que naquele Infante Deus selaria a promessa de nomear o rei de Portugal como Imperador do Quinto Império Judeu-Cristão.

Segura já a décima Sexta geração, e a promessa dela, resta só a da prole, e prole atenuada. Aqui tem os olhos divinos mais que desfazer do que fazer. Porque a prole d’El-rei D. João o quarto não foi atenuada, senão multiplicada. Diz Salomão que o fio, ou o cordão de três ramais dificultosamente se rompe: Funiculus triplex difficilè rumpitur; e tal foi a prole d’El-rei D. João, multiplicada ou triplicada em três filhos: em D. Theodosio, em D. Affonso, em D. Pedro. Destes três havia de desfazer a Providência Divina dois deles, para que ficasse a prole atenuada em um só. (op. cit.: 177)

Neste trecho, reafirmou o que já afirmara antes em relação ao avô, ao tio, ao pai e ao meio-irmão do Infante recém-nascido. Como já foi dito, depois da morte de D. João, sem a concretização das profecias, Vieira transferiu para D. Afonso a honra da reencarnação, quando demonstrou, num discurso persuasivo, que no novo rei se realizariam as promessas de Deus. As afirmações de Vieira, sempre apoiadas em suas premonições, foram todas desmentidas, até então, pelos acontecimentos reais da trajetória de vida dos assinalados. Mas, com o nascimento do Infante, surgia uma nova esperança para o velho sermonista.

A vossos olhos (todo poderoso, e todo misericordioso Senhor) a vossos olhos, posto que debaixo dessa cortina encobertos aos nossos: a vossos olhos vem hoje esta grande e nobilíssima parte de Portugal render as devidas graças pelo fidelíssimo desempenho de vossas promessas. Prometeste que havieis de olhar, e ver: Ipse respiciet, et videbit: e já temos nova certa, de que olhaste, e vistes.

Quatro anos, e mais, se contam hoje, em que pregando eu as exéquias da rainha, que está no céu, fiz dois discursos muito encontrados, um de dor, outro de consolação; um de sentimento, outro de alívio; um triste, outro alegre; um com os olhos no passado, outro com as esperanças no futuro. (op. cit.: 166)

Utilizando-se do estilo cultista no início deste segundo parágrafo do sermão, usando das oposições, mas nem por isto diminuindo o valor do texto, Vieira se refaz de sua longa decepção. Depois, para provar a recuperação de suas idéias, buscou na Bíblia vários trechos que comprovariam o desempenho da palavra de Deus. Recordou a História de Portugal, recordou as visões de Afonso Henriques, que sob inspiração divina previu uma desgraça para o reino de Portugal, mas previu também que na décima sexta geração se atenuaria a prole, ou seja, diminuiria os sofrimentos do reino, por meio de uma nova dinastia. A profecia se realizou com o desaparecimento de D. Sebastião, sem deixar herdeiros, com o curto reinado de D. Henriques, rei-sacerdote, que também não deixou herdeiros, e com a submissão da Coroa Portuguesa à Coroa Espanhola.

Diz Vieira:

Vejamos agora quem foi a décima-Sexta geração d’El-rei D. Afonso I, e quem foi, ou é a prole atenuada da mesma geração décima Sexta. A décima Sexta geração d’El-rei D. Afonso o primeiro, ninguém duvida, que foi El-rei D. João o quarto de eterna memória: e a prole atenuada d’El-rei D. João o quarto também não se pode duvidar, que é El-rei D. Pedro nosso senhor, que Deus guarde; porque depois do falecimento de seus irmãos, nele ficou a décima Sexta geração em um só filho, e por um fio. Segue-se logo com evidência, que na pessoa d’El-rei D. Pedro se cumpriu a atenuação da prole, e que à mesma pessoa d’El-rei D. Pedro prometeu Deus o olhar e ver de seus olhos. (op. cit.: 167)

Além das previsões de Afonso Henriques, havia as predições messiânicas de Bandarra, nas quais o sermonista depositava inegável crédito, mesmo colocando em risco o fiel cumprimento da Doutrina Cristã.

O chamado “Império Consumado de Cristo” era um antigo ideal dos portugueses e Vieira muito contribuiu para a sua propagação. Esse mito, segundo Antônio José Saraiva e Óscar Lopes, era baseado numa mistura de messianismo nacional (sebastianismo e bandarrismo), missionarismo sem fronteiras e do messianismo judaico, que estava (e está) à espera do Salvador.

Vieira acreditou nessas profecias com sinceridade e, por isto, conseguiu dar sentido aos seus vários discursos paradoxais sobre o assunto. Graças também à habilidade discursiva, e as proteções externas, conseguiu livrar-se da Inquisição, que o perseguia, por ver nele uma ameaça para com a ortodoxia cristã.

Vieira acreditou até o fim de sua vida na possibilidade de ver realizada a profecia do Quinto Império Judaico-Cristão, o qual, de acordo com suas crenças, seria edificado pelos portugueses (povo escolhido por Deus). Infelizmente, morreu sem ver realizado seu sonho, mas as verdades momentâneas, que o animaram a acreditar até o fim, estão registradas em seus sermões, e são hoje um precioso material que revela, por um ângulo particular (o ponto de vista de um supersticioso e sonhador sacerdote do século XVII), um longo trecho da História de Portugal.


Este ensaio teórico-crítico (sobre os sermões históricos de Padre Antônio Vieira) está registrado no Ministério de Educação e Cultura (MEC) / Biblioteca Nacional – RJ ¾ Registro de Direitos Autorais ¾ e será publicado (se não houver patrocinador que se interesse pela publicação em livro), em breve, na coletânea de Ensaios de Teoria Literária de Neuza Machado, Editora NMACHADO (Editora da Autora).

sábado, 19 de março de 2011

POR QUE O PRESIDENTE OBAMA NÃO VAI VER O INIMITÁVEL EX-PRESIDENTE LULA NESTA SUA VIAGEM AO BRASIL?

POR QUE O PRESIDENTE OBAMA NÃO VAI VER O INIMITÁVEL EX-PRESIDENTE LULA NESTA SUA VIAGEM AO BRASIL?

NEUZA MACHADO

Meus queridos leitores (os que comungam com os meus bons pressentimentos políticos para o Brasil quiçá para o Mundo), peço-lhes que leiam, no Site Conversa Afiada do Jornalista Paulo Henrique Amorim, o artigo: POR QUE OBAMA NÃO VAI VER O NUNCA DANTES? É um artigo muito interessante e esclarecedor — www.conversaafiada.com.br/mundo/2011/03/19/por-que-o-obama-n%C3%A3o-vai-ver-o-nunca-dantes-por-causa-do-ira/ — (não se preocupem com o termo “Nunca Dantes”, é elogio ao Presidente Lula, não possui conotação ofensiva).

BRASIL PANDEIRO

Autor: Assis Valente

Hoje, 19/03/2011: centenário de nascimento de Assis Valente, autor de Brasil Pandeiro.

sexta-feira, 11 de março de 2011

O ESPELHO DE MACHADO DE ASSIS: QUESTÕES EXEMPLARES NA FICÇÃO REALISTA

O ESPELHO DE MACHADO DE ASSIS: QUESTÕES EXEMPLARES NA FICÇÃO REALISTA

NEUZA MACHADO

Para um reconhecimento da “temática dos espelhos” inserida nas páginas literárias modernas e pós-modernas, de variados ficcionistas, inicialmente submeto ao exame de meus leitores a narrativa “O Espelho” de Machado de Assis (publicado originalmente na Coletânea Papéis Avulsos, em 1882).

Outros contos sobre a mesma temática, de outros escritores já conceituados (brasileiros ou não), serão apreciados, aqui neste Blog, gradativamente. Entretanto, para uma proveitosa incursão nos domínios da Ciência da Literatura, por via fenomenológica, seria de suma importância a prévia leitura da história infanto-juvenil “Alice no País dos Espelhos” do escritor inglês Charles Lutvidge Dodgson, sob o pseudônimo de Levis Carrol (publicado em 04 de julho de 1865).

Uma boa leitura para todos acrescida de primorosas reflexões!


O ESPELHO

Machado de Assis


Esboço de uma nova teoria da alma humana

Quatro ou cinco cavalheiros debatiam, uma noite, várias questões de alta transcendência, sem que a disparidade dos votos trouxesse a menor alteração aos espíritos. A casa ficava no morro de Santa Teresa, a sala era pequena, alumiada a velas, cuja luz fundia-se misteriosamente com o luar que vinha de fora. Entre a cidade, com as suas agitações e aventuras, e o céu, em que as estrelas pestanejavam, através de uma atmosfera límpida e sossegada, estavam os nossos quatro ou cinco investigadores de coisas metafísicas, resolvendo amigavelmente os mais árduos problemas do universo.

Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os que falavam; mas, além deles, havia na sala um quinto personagem, calado, pensando, cochilando, cuja espórtula no debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação. Esse homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre quarenta e cinqüenta anos, era provinciano, capitalista, inteligente, não sem instrução, e, ao que parece, astuto e cáustico. Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com um paradoxo, dizendo que a discussão é a forma polida do instinto batalhador, que jaz no homem, como uma herança bestial; e acrescentava que os serafins e os querubins não controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna. Como desse esta mesma resposta naquela noite, contestou-lha um dos presentes, e desafiou-o a demonstrar o que dizia, se era capaz. Jacobina (assim se chamava ele) refletiu um instante, e respondeu:

— Pensando bem, talvez o senhor tenha razão.

Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este casmurro usou da palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta ou quarenta. A conversa, em seus meandros, veio a cair na natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente os quatro amigos. Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a mesma discussão tornou-se difícil, senão impossível, pela multiplicidade das questões que se deduziram do tronco principal e um pouco, talvez, pela inconsistência dos pareceres. Um dos argumentadores pediu ao Jacobina alguma opinião, — uma conjetura, ao menos.

— Nem conjetura, nem opinião, redarguiu ele; uma ou outra pode dar lugar a dissentimento, e, como sabem, eu não discuto. Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um caso de minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma só alma, há duas...

— Duas?

— Nada menos de duas almas. Cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro... Espantem-se à vontade, podem ficar de boca aberta, dar de ombros, tudo; não admito réplica. Se me replicarem, acabo o charuto e vou dormir. A alma exterior pode ser um espírito, um fluido, um homem, muitos homens, um objeto, uma operação. Há casos, por exemplo, em que um simples botão de camisa é a alma exterior de uma pessoa; — e assim também a polca, o voltarete, um livro, uma máquina, um par de botas, uma cavatina, um tambor, etc. Está claro que o ofício dessa segunda alma é transmitir a vida, como a primeira; as duas completam o homem, que é, metafisicamente falando, uma laranja. Quem perde uma das metades, perde naturalmente metade da existência; e casos há, não raros, em que a perda da alma exterior implica a da existência inteira. Shylock, por exemplo. A alma exterior aquele judeu eram os seus ducados; perdê-los equivalia a morrer. "Nunca mais verei o meu ouro, diz ele a Tubal; é um punhal que me enterras no coração." Vejam bem esta frase; a perda dos ducados, alma exterior, era a morte para ele. Agora, é preciso saber que a alma exterior não é sempre a mesma...

— Não?

— Não, senhor; muda de natureza e de estado. Não aludo a certas almas absorventes, como a pátria, com a qual disse o Camões que morria, e o poder, que foi a alma exterior de César e de Cromwell. São almas enérgicas e exclusivas; mas há outras, embora enérgicas, de natureza mudável. Há cavalheiros, por exemplo, cuja alma exterior, nos primeiros anos, foi um chocalho ou um cavalinho de pau, e mais tarde uma provedoria de irmandade, suponhamos. Pela minha parte, conheço uma senhora, — na verdade, gentilíssima, — que muda de alma exterior cinco, seis vezes por ano. Durante a estação lírica é a ópera; cessando a estação, a alma exterior substitui-se por outra: um concerto, um baile do Cassino, a rua do Ouvidor, Petrópolis...

— Perdão! essa senhora quem é?

— Essa senhora é parenta do diabo, e tem o mesmo nome; chama-se Legião... E assim outros mais casos. Eu mesmo tenho experimentado dessas trocas. Não as relato, porque iria longe; restrinjo-me ao episódio de que lhes falei. Um episódio dos meus vinte e cinco anos...

Os quatro companheiros, ansiosos de ouvir o caso prometido, esqueceram a controvérsia. Santa curiosidade! Tu não és só a alma da civilização, és também o pomo da concórdia, fruta divina, de outro sabor que não aquele pomo da mitologia. A sala, até há pouco ruidosa de física e metafísica, é agora um mar morto; todos os olhos estão no Jacobina, que conserta a ponta do charuto, recolhendo as memórias. Eis aqui como ele começou a narração:

— Tinha vinte e cinco anos, era pobre, e acabava de ser nomeado alferes da Guarda Nacional. Não imaginam o acontecimento que isto foi em nossa casa. Minha mãe ficou tão orgulhosa! tão contente! Chamava-me o seu alferes. Primos e tios, foi tudo uma alegria sincera e pura. Na vila, note-se bem, houve alguns despeitados; choro e ranger de dentes, como na Escritura; e o motivo não foi outro senão que o posto tinha muitos candidatos e que esses perderam. Suponho também que uma parte do desgosto foi inteiramente gratuita: nasceu da simples distinção. Lembra-me de alguns rapazes, que se davam comigo, e passaram a olhar-me de revés, durante algum tempo. Em compensação, tive muitas pessoas que ficaram satisfeitas com a nomeação; e a prova é que todo o fardamento me foi dado por amigos... Vai então uma das minhas tias, D. Marcolina, viúva do Capitão Peçanha, que morava a muitas léguas da vila, num sítio escuso e solitário, desejou ver-me, e pediu que fosse ter com ela e levasse a farda. Fui, acompanhado de um pajem, que daí a dias tornou à vila, porque a tia Marcolina, apenas me pilhou no sítio, escreveu a minha mãe dizendo que não me soltava antes de um mês, pelo menos. E abraçava-me! Chamava-me também o seu alferes. Achava-me um rapagão bonito. Como era um tanto patusca, chegou a confessar que tinha inveja da moça que houvesse de ser minha mulher. Jurava que em toda a província não havia outro que me pusesse o pé adiante. E sempre alferes; era alferes para cá, alferes para lá, alferes a toda a hora. Eu pedia-lhe que me chamasse Joãozinho, como dantes; e ela abanava a cabeça, bradando que não, que era o "senhor alferes". Um cunhado dela, irmão do finado Peçanha, que ali morava, não me chamava de outra maneira. Era o "senhor alferes", não por gracejo, mas a sério, e à vista dos escravos, que naturalmente foram pelo mesmo caminho. Na mesa tinha eu o melhor lugar, e era o primeiro servido. Não imaginam. Se lhes disser que o entusiasmo da tia Marcolina chegou ao ponto de mandar pôr no meu quarto um grande espelho, obra rica e magnífica, que destoava do resto da casa, cuja mobília era modesta e simples... Era um espelho que lhe dera a madrinha, e que esta herdara da mãe, que o comprara a uma das fidalgas vindas em 1808 com a corte de D. João VI. Não sei o que havia nisso de verdade; era a tradição. O espelho estava naturalmente muito velho; mas via-se-lhe ainda o ouro, comido em parte pelo tempo, uns delfins esculpidos nos ângulos superiores da moldura, uns enfeites de madrepérola e outros caprichos do artista. Tudo velho, mas bom...

— Espelho grande?

— Grande. E foi, como digo, uma enorme fineza, porque o espelho estava na sala; era a melhor peça da casa. Mas não houve forças que a demovessem do propósito; respondia que não fazia falta, que era só por algumas semanas, e finalmente que o "senhor alferes" merecia muito mais. O certo é que todas essas coisas, carinhos, atenções, obséquios, fizeram em mim uma transformação, que o natural sentimento da mocidade ajudou e completou. Imaginam, creio eu?

— Não.

— O alferes eliminou o homem. Durante alguns dias as duas naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva cedesse à outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade. Aconteceu então que a alma exterior, que era dantes o sol, o ar, o campo, os olhos das moças, mudou de natureza, e passou a ser a cortesia e os rapapés da casa, tudo o que me falava do posto, nada do que me falava do homem. A única parte do cidadão que ficou comigo foi aquela que entendia com o exercício da patente; a outra dispersou-se no ar e no passado. Custa-lhes acreditar, não?

— Custa-me até entender, respondeu um dos ouvintes.

— Vai entender. Os fatos explicarão melhor os sentimentos: os fatos são tudo. A melhor definição do amor não vale um beijo de moça namorada; e, se bem me lembro, um filósofo antigo demonstrou o movimento andando. Vamos aos fatos. Vamos ver como, ao tempo em que a consciência do homem se obliterava, a do alferes tornava-se viva e intensa. As dores humanas, as alegrias humanas, se eram só isso, mal obtinham de mim uma compaixão apática ou um sorriso de favor. No fim de três semanas, era outro, totalmente outro. Era exclusivamente alferes. Ora, um dia recebeu a tia Marcolina uma notícia grave; uma de suas filhas, casada com um lavrador residente dali a cinco léguas, estava mal e à morte. Adeus, sobrinho! adeus, alferes! Era mãe extremosa, armou logo uma viagem, pediu ao cunhado que fosse com ela, e a mim que tomasse conta do sítio. Creio que, se não fosse a aflição, disporia o contrário; deixaria o cunhado e iria comigo. Mas o certo é que fiquei só, com os poucos escravos da casa. Confesso-lhes que desde logo senti uma grande opressão, alguma coisa semelhante ao efeito de quatro paredes de um cárcere, subitamente levantadas em torno de mim. Era a alma exterior que se reduzia; estava agora limitada a alguns espíritos boçais. O alferes continuava a dominar em mim, embora a vida fosse menos intensa, e a consciência mais débil. Os escravos punham uma nota de humildade nas suas cortesias, que de certa maneira compensava a afeição dos parentes e a intimidade doméstica interrompida. Notei mesmo, naquela noite, que eles redobravam de respeito, de alegria, de protestos. Nhô alferes, de minuto a minuto; nhô alferes é muito bonito; nhô alferes há de ser coronel; nhô alferes há de casar com moça bonita, filha de general; um concerto de louvores e profecias, que me deixou extático. Ah ! pérfidos! mal podia eu suspeitar a intenção secreta dos malvados.

— Matá-lo?

— Antes assim fosse.

— Coisa pior?

— Ouçam-me. Na manhã seguinte achei-me só. Os velhacos, seduzidos por outros, ou de movimento próprio, tinham resolvido fugir durante a noite; e assim fizeram. Achei-me só, sem mais ninguém, entre quatro paredes, diante do terreiro deserto e da roça abandonada. Nenhum fôlego humano. Corri a casa toda, a senzala, tudo; ninguém, um molequinho que fosse. Galos e galinhas tão-somente, um par de mulas, que filosofavam a vida, sacudindo as moscas, e três bois. Os mesmos cães foram levados pelos escravos. Nenhum ente humano. Parece-lhes que isto era melhor do que ter morrido? Era pior. Não por medo; juro-lhes que não tinha medo; era um pouco atrevidinho, tanto que não senti nada, durante as primeiras horas. Fiquei triste por causa do dano causado à tia Marcolina; fiquei também um pouco perplexo, não sabendo se devia ir ter com ela, para lhe dar a triste notícia, ou ficar tomando conta da casa. Adotei o segundo alvitre, para não desamparar a casa, e porque, se a minha prima enferma estava mal, eu ia somente aumentar a dor da mãe, sem remédio nenhum; finalmente, esperei que o irmão do tio Peçanha voltasse naquele dia ou no outro, visto que tinha saído havia já trinta e seis horas. Mas a manhã passou sem vestígio dele; à tarde comecei a sentir a sensação como de pessoa que houvesse perdido toda a ação nervosa, e não tivesse consciência da ação muscular. O irmão do tio Peçanha não voltou nesse dia, nem no outro, nem em toda aquela semana. Minha solidão tomou proporções enormes. Nunca os dias foram mais compridos, nunca o sol abrasou a terra com uma obstinação mais cansativa. As horas batiam de século a século no velho relógio da sala, cuja pêndula tic-tac, tic-tac, feria-me a alma interior, como um piparote contínuo da eternidade. Quando, muitos anos depois, li uma poesia americana, creio que de Longfellow, e topei este famoso estribilho: Never, for ever! — For ever, never! confesso-lhes que tive um calafrio: recordei-me daqueles dias medonhos. Era justamente assim que fazia o relógio da tia Marcolina: — Never, for ever!— For ever, never! Não eram golpes de pêndula, era um diálogo do abismo, um cochicho do nada. E então de noite! Não que a noite fosse mais silenciosa. O silêncio era o mesmo que de dia. Mas a noite era a sombra, era a solidão ainda mais estreita, ou mais larga. Tic-tac, tic-tac. Ninguém, nas salas, na varanda, nos corredores, no terreiro, ninguém em parte nenhuma... Riem-se?

— Sim, parece que tinha um pouco de medo.

— Oh! fora bom se eu pudesse ter medo! Viveria. Mas o característico daquela situação é que eu nem sequer podia ter medo, isto é, o medo vulgarmente entendido. Tinha uma sensação inexplicável. Era como um defunto andando, um sonâmbulo, um boneco mecânico. Dormindo, era outra coisa. O sono dava-me alívio, não pela razão comum de ser irmão da morte, mas por outra. Acho que posso explicar assim esse fenômeno: — o sono, eliminando a necessidade de uma alma exterior, deixava atuar a alma interior. Nos sonhos, fardava-me orgulhosamente, no meio da família e dos amigos, que me elogiavam o garbo, que me chamavam alferes; vinha um amigo de nossa casa, e prometia-me o posto de tenente, outro o de capitão ou major; e tudo isso fazia-me viver. Mas quando acordava, dia claro, esvaía-se com o sono a consciência do meu ser novo e único -porque a alma interior perdia a ação exclusiva, e ficava dependente da outra, que teimava em não tornar... Não tornava. Eu saía fora, a um lado e outro, a ver se descobria algum sinal de regresso. Soeur Anne, soeur Anne, ne vois-tu rien venir? Nada, coisa nenhuma; tal qual como na lenda francesa. Nada mais do que a poeira da estrada e o capinzal dos morros. Voltava para casa, nervoso, desesperado, estirava-me no canapé da sala. Tic-tac, tic-tac. Levantava-me, passeava, tamborilava nos vidros das janelas, assobiava. Em certa ocasião lembrei-me de escrever alguma coisa, um artigo político, um romance, uma ode; não escolhi nada definitivamente; sentei-me e tracei no papel algumas palavras e frases soltas, para intercalar no estilo. Mas o estilo, como tia Marcolina, deixava-se estar. Soeur Anne, soeur Anne... Coisa nenhuma. Quando muito via negrejar a tinta e alvejar o papel.

— Mas não comia?

— Comia mal, frutas, farinha, conservas, algumas raízes tostadas ao fogo, mas suportaria tudo alegremente, se não fora a terrível situação moral em que me achava. Recitava versos, discursos, trechos latinos, liras de Gonzaga, oitavas de Camões, décimas, uma antologia em trinta volumes. Às vezes fazia ginástica; outra dava beliscões nas pernas; mas o efeito era só uma sensação física de dor ou de cansaço, e mais nada. Tudo silêncio, um silêncio vasto, enorme, infinito, apenas sublinhado pelo eterno tic-tac da pêndula. Tic-tac, tic-tac...

— Na verdade, era de enlouquecer.

— Vão ouvir coisa pior. Convém dizer-lhes que, desde que ficara só, não olhara uma só vez para o espelho. Não era abstenção deliberada, não tinha motivo; era um impulso inconsciente, um receio de achar-me um e dois, ao mesmo tempo, naquela casa solitária; e se tal explicação é verdadeira, nada prova melhor a contradição humana, porque no fim de oito dias deu-me na veneta de olhar para o espelho com o fim justamente de achar-me dois. Olhei e recuei. O próprio vidro parecia conjurado com o resto do universo; não me estampou a figura nítida e inteira, mas vaga, esfumada, difusa, sombra de sombra. A realidade das leis físicas não permite negar que o espelho reproduziu-me textualmente, com os mesmos contornos e feições; assim devia ter sido. Mas tal não foi a minha sensação. Então tive medo; atribuí o fenômeno à excitação nervosa em que andava; receei ficar mais tempo, e enlouquecer. - Vou-me embora, disse comigo. E levantei o braço com gesto de mau humor, e ao mesmo tempo de decisão, olhando para o vidro; o gesto lá estava, mas disperso, esgarçado, mutilado... Entrei a vestir-me, murmurando comigo, tossindo sem tosse, sacudindo a roupa com estrépito, afligindo-me a frio com os botões, para dizer alguma coisa. De quando em quando, olhava furtivamente para o espelho; a imagem era a mesma difusão de linhas, a mesma decomposição de contornos... Continuei a vestir-me. Subitamente por uma inspiração inexplicável, por um impulso sem cálculo, lembrou-me... Se forem capazes de adivinhar qual foi a minha idéia...

— Diga.

— Estava a olhar para o vidro, com uma persistência de desesperado, contemplando as próprias feições derramadas e inacabadas, uma nuvem de linhas soltas, informes, quando tive o pensamento... Não, não são capazes de adivinhar.

— Mas, diga, diga.

— Lembrou-me vestir a farda de alferes. Vesti-a, aprontei-me de todo; e, como estava defronte do espelho, levantei os olhos, e...não lhes digo nada; o vidro reproduziu então a figura integral; nenhuma linha de menos, nenhum contorno diverso; era eu mesmo, o alferes, que achava, enfim, a alma exterior. Essa alma ausente com a dona do sítio, dispersa e fugida com os escravos, ei-la recolhida no espelho. Imaginai um homem que, pouco a pouco, emerge de um letargo, abre os olhos sem ver, depois começa a ver, distingue as pessoas dos objetos, mas não conhece individualmente uns nem outros; enfim, sabe que este é Fulano, aquele é Sicrano; aqui está uma cadeira, ali um sofá. Tudo volta ao que era antes do sono. Assim foi comigo. Olhava para o espelho, ia de um lado para outro, recuava, gesticulava, sorria e o vidro exprimia tudo. Não era mais um autômato, era um ente animado. Daí em diante, fui outro. Cada dia, a uma certa hora, vestia-me de alferes, e sentava-me diante do espelho, lendo olhando, meditando; no fim de duas, três horas, despia-me outra vez. Com este regime pude atravessar mais seis dias de solidão sem os sentir...

Quando os outros voltaram a si, o narrador tinha descido as escadas.


OBRA COMPLETA, Machado de Assis, vol. II, Nova Aguilar, Rio de Janeiro, 1994.

terça-feira, 8 de março de 2011

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

NEUZA MACHADO

Hoje, dia 08 de Março de 2011 — DIA INTERNACIONAL DA MULHER —, desejo parabenizar às mulheres do Brasil e do Mundo e desejar-lhes um sem-fim de momentos felizes.

Para mim, que nasci em um Estado Federativo do Brasil seguidor de severíssimas leis patriarcais — Estado de Minas Gerais —, o fato da mulher brasileira, na pessoa de nossa Presidenta Dilma Rousseff, ter alcançado o patamar mais elevado na hierarquia político-social, é algo muito significativo. A confiança da entrega da gerência do país a uma mulher traduz o nível de desenvolvimento do nosso povo, mas primeiramente revela a capacidade e responsabilidade da mulher brasileira em assumir cargos de comando dentro dos vários tipos de núcleos sociais: mães-chefes-de-família; presidentas de associação de moradores; presidentas de clubes desportivos (ambiente altamente competitivo), etc.

É bem verdade que as brasileiras ainda não recebem o devido respeito. Infelizmente ainda há o preconceito de que “mulher no comando” ou é marionete de algum homem ou possui mais qualidades masculinas do que femininas. A propósito desse preconceito, deveríamos nos indagar: quando na História da Civilização do Homem ficou acordado que as qualidades superiores do Espírito seriam exclusivas do gênero masculino? Nessa assembléia de tempos remotos, quais qualidades predominavam nos participantes quando fundaram o Sistema Patriarcado? Mas, de acordo com os preceitos nascidos a partir da geração dos anos 1970, não devemos sentir rancor pelas decisões mal tomadas anteriormente.

Por fim, terminando esta minha mensagem às mulheres brasileiras, extendendo-a também às mulheres estrangeiras, gostaria que os meus leitores apreciassem este belíssimo poema musicado de Erasmo Carlos. Erasmo Carlos soube colocar no papel os seus sentimentos de amor por Narinha, sua esposa, e com isto homenageou todas as mulheres da época alcançando, em seu poema-arte, as gerações futuras.

Apreciem a letra e música de Erasmo Carlos clicando no Site letras.terra.com.br/erasmo-carlos/67612/


MULHER

(Autores: Erasmo Carlos e Narinha)


Dizem que a mulher é o sexo frágil
Mas que mentira absurda!
Eu que faço parte da rotina de uma delas
Sei que a força está com elas...

Vejam como é forte a que eu conheço
Sua sapiência não tem preço
Satisfaz meu ego se fingindo submissa
Mas no fundo me enfeitiça...

Quando eu chego em casa à noitinha
Quero uma mulher só minha
Mas pra quem deu luz não tem mais jeito
Porque um filho quer seu peito...

O outro já reclama a sua mão
E o outro quer o amor que ela tiver
Quatro homens dependentes e carentes
Da força da mulher...

Mulher! Mulher!
Do barro de que você foi gerada
Me veio inspiração
Pra decantar você nessa canção...

Mulher! Mulher!
Na escola em que você foi ensinada
Jamais tirei um 10
Sou forte mas não chego aos seus pés...

(Repetir a letra)

sexta-feira, 4 de março de 2011

TRISTE REALIDADE: A MÚSICA COMO COLABORADORA DE CONQUISTAS AMOROSAS NO BRASIL DO TERCEIRO MILÊNIO

TRISTE REALIDADE: A MÚSICA COMO COLABORADORA DE CONQUISTAS AMOROSAS NO BRASIL DO TERCEIRO MILÊNIO

NEUZA MACHADO

Recebi o texto abaixo, sem autoria reconhecida, por intermédio de um e-mail que me foi enviado por um amigo. Acredito que este texto já esteja circulando pela Internet há um bom tempo. Na Internet há textos que devemos rejeitar, entretanto, há outros que devemos propagar. Este texto, que me foi enviado por este amigo (aviso-lhes que só abro os e-mails dos amigos, ou seja, somente os e-mails confiáveis), é um deles (há a necessidade de conscientizarmo-nos das baixarias musicais a “apedrejar” os nossos ouvidos).

Infelizmente, asseguro-lhes que esta é a realidade de um segmento de nossa atual música e do respeito que alguns autores deveriam ter para com as mulheres brasileiras nestes últimos dez anos.

Posso afiançar-lhes que esta é realmente a triste realidade, pelo menos aqui na Cidade do Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa. Como não dirijo e não tenho automóvel próprio, vou sempre para o trabalho em uma ou outra das inúmeras Vans que circulam por nossos bairros residenciais como condução alternativa. Nas ditas Vans, vou ouvindo estas “belezuras” musicais em sons altissonantes. Alguns motoristas não têm o mínimo respeito pelos passageiros, colocando em seus rádios ou players (MP3, DVD, etc.) músicas de baixo calão (evidentemente, não são todos). Infelizmente, não posso externar a minha indignação e fico calada, pois não seria de boa política reclamar, uma vez que necessito das ditas conduções.

Meus queridos leitores! A pura verdade é que alguns funks, proibidões e outras “pérolas” já tomaram conta do nosso cotidiano carioca e as ditas “pedradas” musicais vão a espalhar-se por nossas ruas e bairros, sem pedir licença aos ouvidos escrupulosos.


Eis o texto:


TRISTE REALIDADE

Uma análise da evolução da relação de conquista e do amor do homem para a mulher através das músicas que marcaram época.

Não é saudosismo, mas vejam como os quarentões, cinquentões tratavam seus amores.
É por isso que de vez em quando vemos uma mulher nova enroscada no pescoço de um quarentão.

(E a partir de 2001, observem como as jovens brasileiras foram e ainda são tratadas musicalmente, independente do patamar social, sejam ricas ou pobres).

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Década de 30:

Ele, de terno cinza e chapéu panamá, em frente à vila onde ela mora, canta:

"Tu és, divina e graciosa,
estátua majestosa!
Do amor por Deus esculturada.
És formada com o ardor
da alma da mais linda flor,
de mais ativo olor,
na vida
é a preferida
pelo beija-flor..."

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Década de 40:

Ele ajeita seu relógio Pateck Philip na algibeira, escreve para Rádio Nacional e,
manda oferecer a ela uma linda música:

"A deusa da minha rua,
tem os olhos onde a lua
costuma se embriagar.
Nos seus olhos eu suponho,
que o sol num dourado sonho,
vai claridade buscar"

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Década de 50:

Ele pede ao cantor da boate que ofereça a ela a interpretação de uma bela bossa:

" Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça.
É ela a menina que vem e que passa,
no doce balanço a caminho do mar.
Moça do corpo dourado, do sol de Ipanema.
O teu balançado é mais que um poema.
É a coisa mais linda que eu já vi passar."

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Década de 60:

Ele aparece na casa dela com um compacto simples embaixo do braço,
ajeita a calça Lee e coloca na vitrola uma música papo firme:

"Nem mesmo o céu, nem as estrelas,
nem mesmo o mar e o infinito
não é maior que o meu amor,
nem mais bonito.
Me desespero a procurar
alguma forma de lhe falar,
como é grande o meu amor por você..."

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Década de 70:

Ele chega em seu fusca, com roda tala larga, sacode o cabelão,
abre porta pra mina entrar e bota uma melô jóia no toca-fitas:

"Foi assim, como ver o mar, a primeira vez
que os meus olhos se viram no teu olhar....
Quando eu mergulhei no azul do mar,
sabia que era amor e vinha pra ficar...."

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Década de 80:

Ele telefona pra ela e deixa rolar um:

"Fonte de mel, nos olhos de gueixa, Kabuki, máscara.
Choque entre o azul e o cacho de acácias,
luz das acácias, você é mãe do sol. Linda...."

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Década de 90:

Ele liga pra ela e deixa gravada uma música na secretária eletrônica:

"Bem que se quis,
depois de tudo ainda ser feliz.
Mas já não há caminhos pra voltar.

E o que é que a vida fez da nossa vida?
O que é que a gente não faz por amor?"

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Em 2001:

Ele captura na internet um batidão legal e manda pra ela, por e-mail:

"Tchutchuca!
Vem aqui com o teu Tigrão.
Vou te jogar na cama
e te dar muita pressão!
Eu vou passar cerol na mão,
vou sim, vou sim!
Eu vou te cortar na mão!
Vou sim, vou sim!
Vou aparar pela rabiola!
Vou sim, vou sim"!

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Em 2002:

Ele manda um e-mail oferecendo uma música:

"Só as cachorras! Hu Hu Hu Hu Hu!
As preparadas! Hu Hu Hu Hu!
As poposudas! Hu Hu Hu Hu Hu!"

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Em 2003:

Ele oferece uma música no baile:


"Pocotó pocotó pocotó...
minha eguinha pocotó!

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Em 2004:

Ele a chama para dançar no meio da pista:

"Ah! Que isso?
Elas estão descontroladas!
Ah! Que isso?
Elas Estão descontroladas!
Ela sobe,
ela desce,
ela dá uma rodada,
elas estão descontroladas!"

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Em 2005:

Ele resolve mandar um convite para ela, através da rádio:

"Hoje é festa lá no meu apê,
pode aparecer,
vai rolar bunda lelê!"


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Em 2006:

Ele a convida para curtir um baile ao som da música mais pedida e tocada no país:

"Tô ficando atoladinha,
tô ficando atoladinha,
tô ficando atoladinha!!!

Calma, calma foguetinha!!!
Piriri Piriri Piriri,
alguém ligou para mim!"

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Em 2010:

Ele encosta com seu carro com o porta-malas cheio de som e no máximo volume:

" Chapeuzinho pra onde você vai,
diz aí menina que eu vou atrás.
Pra que você quer saber?
Eu sou o lobo mau, au, au
Eu sou o lobo mau, au, au
E o que você vai fazer?
Vou te comer,
vou te comer,
vou te comer,
Vou te comer,
vou te comer,
vou te comer,
Vou te comer,
vou te comer,
vou te comer"

terça-feira, 1 de março de 2011

FELIZ ANIVERSÁRIO RIO DE JANEIRO CIDADE MARAVILHOSA

FELIZ ANIVERSÁRIO RIO DE JANEIRO CIDADE MARAVILHOSA

NEUZA MACHADO

Feliz Aniversário Cidade Maravilhosa!


Minha Bela Cidade do Rio de Janeiro!


Hoje eu quero esquecer a manifestação da face terrível de sua Natureza Tropical que nos afetou no mês de janeiro e exaltar as Belezas Sutis dessa mesma Entidade que somente os Nativos e os Adotivos têm o privilégio de pressentir. Os Problemas Climáticos e as Inércias Políticas não são suficientes para diminuir a Excelência de sua Beleza!

Minha/Nossa Cidade Maravilhosa conseguiu chegar aos seus 446 anos ainda com brilho no olhar, apesar das pálpebras cansadas, e com viço nas faces, a despeito da pele marcada pelos inúmeros desarranjos governamentais do passado século XX.

Você, minha Inigualável Cidade, deu a volta por cima e provou que, da combinação genética do branco-negro-e-índio, acrescido do idioma português e das primeiras contribuições linguísticas indígena e africana, e de muitos outros acréscimos estrangeiros que vieram depois, surgiu uma Alma que é a síntese da essência dessas inúmeras culturas: o Povo Carioca.

O carioca, que de bobo não tem nada, ficou no Plano da História do século XX esperando o momento certo de brilhar pra valer, assim como quem acabou de perder a condução e fica na expectativa de uma outra melhor, e, como quem espera com convicção sempre alcança, persistindo em sua luta diária, desde o início do século XXI conseguiu vencer e convencer seus políticos de que merecia um muito de cuidado e atenção (o que nem sempre recebeu anteriormente: prédios históricos abandonados ou demolidos, calçadas centenárias sendo destruídas em nome de um pretenso progresso, praias mal cuidadas e outros males), os quais (os políticos), depois dessa persistência, passaram a olhar o Povo e a Cidade com outros olhos... E, desde que o Rio de Janeiro foi escolhido para ser a Sede das Olimpíadas em 2016, muitas obras já se iniciaram e muitas outras irão se fazer. É esperar para ver!

E é por causa desse Povo Cordial, que não faz alarde de suas vitórias (apenas as comemora com entusiasmo e alegria), que prefere perder a condução, mas não deixa de apreciar um lindo por de sol, é exatamente por causa desse Povo Ímpar que a nossa Cidade é Maravilhosa.

E para comemorar mais um ano de vida de minha/nossa Cidade, é bom relembrar uma de suas canções mais famosas: a VALSA DE UMA CIDADE, escrita e musicada com raríssima inspiração por Ismael Neto e Antônio Maria, aqui apresentada na voz da cantora paulista Rita Lee.




VALSA DE UMA CIDADE

Autores: Ismael Neto e Antônio Maria


Vento do mar no meu rosto
E o sol a brilhar, brilhar
Calçada cheia de gente
A passar e a me ver passar

Rio de Janeiro, gosto de você
Gosto de quem gosta
Deste céu, desse mar,
Dessa gente feliz

Bem que eu quis escrever
Um poema de amor e o amor
Estava em tudo que eu quis
Em tudo quanto eu amei
E no poema que eu fiz
Tinha alguém mais feliz que eu
O meu amor
Que não me quis

Em tudo quanto eu amei
E no poema que eu fiz
Tinha alguém mais feliz que eu
O meu amor
Que não me quis

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

SOBRE A MÍDIA BRASILEIRA E O EX-PRESIDENTE LULA

SOBRE A MÍDIA BRASILEIRA E O EX-PRESIDENTE LULA

NEUZA MACHADO

Peço aos meus leitores brasileiros (àqueles que comungam com meus ideais políticos e partilham de minha afeição e respeito pelo Ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva), manifestando também este meu pedido aos meus leitores brasileiros (os estrangeiros também) que moram fora do Brasil (e não têm muita noção do que ocorre por aqui, ou seja, do quanto o Ex-Presidente Lula foi maltratado pela grande mídia brasileira durante os seus oito anos de mandato, e ainda é — não o deixam em paz, comparando-o depreciativamente com a Presidenta Dilma, no intuito de abalar a afinidade política que há entre os dois), que leiam o texto do jornalista Maurício Dias, da Revista CARTA CAPITAL: “Um império contra um operário”, 18 de fevereiro de 2011 — cartacapital.com.br/destaques_carta_capital/um-imperio-contra-um-operario.

Por favor, não deixem de ler o artigo deste idôneo jornalista desta excelente Revista. O jornalista Maurício Dias mostra em seu texto que a grande mídia brasileira [e principalmente a pequena, mas furiosa e toda poderosa elite brasileira que se considera a tal] nunca suportou a ascensão do Operário-Político Lula da Silva e a sua Vitoriosa Gestão no Palácio da Alvorada.

Lembrem-se de que a minha propaganda do Site da Revista acima mencionado é gratuita. E não me cansarei de prestigiar aqui em meus Blogs o Ex-Presidente Lula (que ficará na História do Brasil como o nosso Primeiro Maior Presidente Popular, o que é diferente de Populista — outros grandes Presidentes Brasileiros virão naturalmente) e a atual Presidenta Dilma Rousseff e os jornalistas idôneos.

Nesses meus anos de vida, eu recebi o privilégio de saber ler e avaliar o que se apresenta aos leitores brasileiros nos jornais e revistas. Aprendi a ler as linhas e a detectar as armadilhas políticas nas entrelinhas dos textos de Revistas e Jornais. Aprendi a separar o joio do trigo.

Se quiserem saber mais, a respeito do fato de o Ex-Presidente Lula continuar sendo o mal-amado da “grande” mídia, acessem o Site Conversa Afiada do jornalista Paulo Henrique Amorim (a propaganda também é gratuita, porque merece ser difundida, alastrada, espalhada, tornada de domínio público): http://www.conversaafiada.com.br/.

Desde já, recebam os meus sinceros agradecimentos por suas visitas aos meus Blogs.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE E “OS AMORES E OS MÍSSEIS”

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE E “OS AMORES E OS MÍSSEIS”

NEUZA MACHADO


(clique na página ao lado para aumentá-la)


Em 02 de dezembro de 2010, no auge de um momento ruidoso (pós-eleições presidenciais e governamentais) em que o Rio de Janeiro se transformara em uma praça de guerra, publiquei aqui neste meu Blog Neuza Machado
neumac.blogspot.com/2010/12/drummond-e-lamentavel-historia-dos.html uma crônica poética (crônica em versos) de Carlos Drummond de Andrade, cujo título revelava um momento de preocupação social do escritor — A LAMENTÁVEL HISTÓRIA DOS NAMORADOS — escrita para o Jornal do Brasil em 11 de junho de 1983.

Impressionou-me o fato de que a crônica (em versos) de Carlos Drummond (escrita para ser lida e refletida pelos leitores de jornal daquele momento, terceiro ano da década de 1980) ainda continuava válida para reflexões intermitentes vinte sete anos depois, e que estava ainda muito de acordo com os acontecimentos daquele final de ano de 2010.

Assim, apesar dos meus conceitos teóricos, dei-me conta de que algumas crônicas (poéticas ou não) podem ultrapassar os seus limites e alcançar o Panteón da Arte Literária (as crônicas são lineares, mesmo as escritas em versos, e são elaboradas para serem lidas no exato momento de suas confecções). A crônica (dentro de seu próprio tempo), segundo os conceitos teóricos vigentes, para os leitores do futuro será sempre considerada como um documento, servindo para explicar ou denunciar realidades já passadas. O texto literário-arte pelo ponto de vista da Teoria Literária é aquele que, a partir de sua publicação, ultrapassa as barreiras de seu próprio tempo, continuando repleto de vigor, e continuando a sua ação de “incomodar” os leitores do futuro num diálogo permanente (obrigando-os a repensarem a sua própria realidade). São conceitos corretos, é bem verdade, mas, algumas crônicas, como muitas crônicas de Carlos Drummond de Andrade (muitas delas são crônicas poéticas), já assinalam o seu valor como texto-arte, pois conseguiram ultrapassar as tais barreiras de seu próprio tempo. A crônica supracitada, por exemplo, demonstrou que os problemas sociais detectados pelo grande poeta brasileiro em 1983 continuaram/continuam "inquietando" seus leitores ao longo desses vinte e sete anos.

Carlos Drummond de Andrade foi (antes de tudo o que realizou como sujeito ou indivíduo, como participante ativo do século XX) um excepcional poeta lírico. Não sem razão, algumas de suas crônicas (poéticas ou não) poderão ser conceituadas como puríssimos textos-arte. Muitas de suas crônicas não serão simplesmente documentos da realidade sócio-histórica do século XX. Algumas ainda refletirão no futuro, como se fossem espelhos, os problemas vivenciados pelo Poeta no passado. É como se ele fosse ainda vivo e, por meio de seus leitores do futuro, estivesse vendo tudo pela primeira vez.

Não sei se me fiz entender pelos meus leitores de hoje (11 de fevereiro de 2011). Se houver alguma falha, tentarei explicar em postagens posteriores. Enquanto as dúvidas não aparecem, peço-lhes que leiam esta outra crônica-poema de Carlos Drummond de Andrade — OS AMORES E OS MÍSSEIS — e procurem refletir comigo:

Esta crônica escrita por Carlos Drummond de Andrade em 26 de novembro de 1986 (para os leitores do Jornal do Brasil daquele momento) é uma simples informação do passado ou ainda “incomoda” os leitores de hoje?

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

MÁRIO DE ANDRADE: UM PRENUNCIADOR? - CAFÉ: CONCEPÇÃO MELODRAMÁTICA

MÁRIO DE ANDRADE: UM PRENUNCIADOR? - CAFÉ: CONCEPÇÃO MELODRAMÁTICA

NEUZA MACHADO

Hoje postei em meu outro Blog neuzamachadoletras.blogspot.com a última etapa do texto CAFÉ: CONCEPÇÃO MELODRAMÁTICA (Em três atos) de Mário de Andrade. Pretendo colocar em sala de aula, neste semestre, a questão miséria X riqueza, detectada e transformada em excelentes textos literários, ao longo do século XX, por grandes escritores brasileiros e portugueses.

A ordem agora é problematizar as questões levantadas a partir do conteúdo programático de cada disciplina, em sala de aula, interligadas (essas questões) com a realidade circundante. Uma ordem que, em relação à minha atuação como professora de Ciência da Literatura, Literatura Brasileira e Literatura Portuguesa, reforçou o caminho por mim trilhado. A minha forma de transmitir conhecimentos sobre Literatura sempre foi por meio de argumentações. A necessidade de ter uma visão dilatada em relação à Literatura, forçou-me a refletir o subentendido, o incógnito dos textos literários das Literaturas de todos os tempos e lugares. Esses textos dignos de serem pensados e repensados nortearam as minhas atuações em sala de aula. Até o momento, não me preocupei com esquemas didáticos fechados e pré-concebidos. Sempre me coloquei à disposição de meus alunos para dialogar com eles além das propostas de um limitado Programa de Literatura. Se eu falei mais em sala de aula foi porque os próprios alunos assim o quiseram. Nunca lhes neguei o diálogo produtivo e construtivo. Nunca me coloquei como a dona suprema de verdades eternas: “Mestre não é quem sempre ensina, mas aquele que de repente aprende”, já dizia o escritor mineiro Guimarães Rosa. Aprendi que mais vale estar aberta para interagir com novos conhecimentos do que confortavelmente desfrutando de informações teóricas já testadas (não que as mesmas sejam indispensáveis, serão sempre importantes pelo ponto de vista dialético). Por isto, os convido, meus Amigos-Leitores-Internautas, a visitarem este meu outro Blog. O tema via Mário de Andrade ainda não se esgotou. Amanhã pretendo colocar no NEUZA MACHADO-LETRAS mais questões importantes e trechos da literatura desse nosso famoso e importantíssimo escritor.