A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: A
SANZALA DO AVÔ JOAQUIM PEREIRA
ANTÔNIO DE SOUSA COSTA
Voltando aos escravos, eles
tinham também a sua residência, a sanzala, que eu, Antônio de Sousa Costa, ainda
alcancei, que era construída com esteios de braúna fincados no chão, medindo um
comprimento de uns cem metros, mais ou menos. Dizia a minha avó Maria Brasilina
de Jesus que eles tinham suas diversões. Dançavam Caxambu, batendo caixa, e
dançando, e cantando. Isto era em dia de sábado para domingo, porque ninguém
trabalhava aos domingos. Eles cantavam jongo [jogo] de macumba, batendo caixa;
um jogava ponto para o outro. Os dirigentes da dança eram tio Luca e tia Ana.
Diziam que eles cantavam assim: “– O tatu tá no mônho [moinho]?”; os outros respondiam: “– Tá comendo fubá!” Esta cantiga era repetida várias vezes. Tinha uma
outra cantiga que eu não esqueci: “Tição rolou, queimou meu pé. Batuque na
cozinha, sinhá não qué”. Isto era
assim: um cantando e outros respondendo; sendo que um tirava o ponto e os
outros, que estavam na dança, respondiam. E tinha uma outra cantiga, também,
que eles costumavam cantar. Era chamada dança do gambá: “– Tem demanda com ovo
de galinha parente!”; os outros, que estavam na dança, respondiam: “– Vamo s’embora,
gente!”
Eu ainda conheci alguns dos
escravos de meu avô Joaquim Pereira. Tio Lucas e tia Ana já eram bem velhinhos
e moravam na Fazenda Rochedo, que pertencia ao Capitão Francisco Victor da
Silva, mais conhecido por Chico Victor. Tem uma lenda, muito engraçada, que
aconteceu com os dois pretos velhos. Os que contavam esta lenda eram os dois
filhos do Capitão Chico Victor: o mais velho, Atlatino Victor, e o outro,
Higino Victor. Eles contavam com tanta graça que, todos aqueles que estavam
ouvindo, caíam na gargalhada. E, eles, floreavam
a lenda. Diziam que tio Lucas e tia Ana tocavam um pedaço da lavoura de café,
na Fazenda do pai deles, o Capitão Chico Victor, e venderam o café, pagaram o
que deviam, e sobrou ainda uma boa quantia em dinheiro, três contos de réis.
Eles, tio Lucas e tia Ana, tinham dois canudos de taquaruçú; em um eles
guardavam o dinheiro, e o outro servia de penico, para urinarem à noite. Uma
noite, eles beberam muita cachaça e foram dormir. Lá pela meia-noite, acordaram
e foram verter urina, e pegaram o canudo do dinheiro, e mijaram dentro do
canudo. No outro dia foi que eles perceberam que tinham acabado com o dinheiro,
e foram reclamar com o patrão, que era o Capitão Chico Victor, que riu muito e
disse pra eles: “– Quando vocês
ganharem outro dinheiro, tomem mais cuidado, já viu?”
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